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Porque o incesto(relações sexuais entre parentes próximos maiores)não é crime no Brasil?

A definição jurídica do incesto vem do latim incestu (impuro, impudico) e é definido como a conjunção carnal entre parentes por consangüinidade ou afinidade, que se acham, em grau, interditados, ou proibidos, para as justas núpcias. O artigo 183, do atual Código Civil, define esta proibição. Já a Psicanálise o denota como uma relação sexual ou marital entre duas pessoas consideradas, pela sociedade, como tão próximas que a união ou qualquer proximidade mais íntima entre elas torna-se proibida (tabu do incesto). Qual a origem de tanta repugnância pelo incesto em nossa sociedade? E porque o Brasil ainda não criminalizou esta conduta e a positivou no Código Penal Brasileiro?

                         Praticamente todas as definições de incesto estão ligadas à idéia de proibição. Primeiro, a teoria biológica de um “horror inato ao incesto”, considera-o como a proteção natural contra os malefícios do cruzamento endogâmico. Já a teoria moral reporta a aspectos socioculturais, entendendo que, de acordo com uma perspectiva estruturalista, a proibição do incesto é cultural, mas necessária para o desenvolvimento do indivíduo na sociedade. A Bíblia o veda em Levítico 18:6 “não descobrirás a nudez da mulher de teu irmão; é a nudez de teu irmão”.

                        Assim, nota-se que, desde que o mundo é mundo, seres humanos e animais são sexuados. Observa-se também que as práticas sexuais obedecem a regras e exigências naturais, além das culturais. As proibições e permissões são interiorizadas pela consciência individual, graças a inúmeros procedimentos sociais expulsando, para longe da consciência, quando transgredidas, porque, neste caso, trazem sentimentos de dor, tristeza e culpa que desejamos ocultar. Os antropólogos e psicanalistas consideram que o momento da passagem do sexo natural ao sexo cultural, isto é, simbolizado e sujeito a códigos, ocorre com a determinação do primeiro e mais importante dos interditos: a proibição do incesto.
                        Do ponto de vista freudiano, há uma discussão mais filosófica do assunto, caracterizando a psiquê em suas três instâncias: id, ego e superego, onde se desenvolvem os mecanismos que envolvem a questão do incesto, o qual, para Freud, encontra-se emaranhado à questão do Édipo, vastamente investigada ao longo de toda a sua obra, sendo um dos pilares de sua teoria. Para suas formulações teóricas a respeito do incesto, Freud, o Pai da Psicanálise, lança mão da antropologia, mais especificamente de Lévi-Strauss e sua obra, a qual  tem uma importância fundamental na elaboração de “Totem e Tabu”, onde Freud disseca a questão do incesto frente ‘natureza-cultura’, afirmando que o horror ao incesto vem como uma forma inconsciente, individual e coletiva, de se organizar a sociedade humana de uma forma que a distinga dos animais irracionais. Nota-se que se trata de questões bastante complexas, que até hoje suscitam discussões acaloradas entre os teóricos da chamada área psi.
                        Por outro lado, a sexualidade não deve ser confundida com o instinto sexual, porque este é um comportamento fixo e pré-formado, característico de uma espécie, enquanto a sexualidade se caracteriza por uma grande plasticidade, própria do ser humano, produto cultural, invenção e relação com a história pessoal de cada um de nós. A incidência do incesto pode ser de várias formas que não a relação sexual genital, portanto, a compreensão deste fenômeno deve levar em conta a dinâmica afetiva da família como um todo, sendo que os desejos incestuosos são formados pela falta das funções estruturantes dentro da família. Por se tratar de uma questão de estruturação psicossocial, a resolução do problema não passa apenas pelo âmbito “educativo”.
                        Assim, o fenômeno ou o fato da repressão sexual é tão antigo quanto a vida humana em sociedade, entretanto, o conceito mencionado é bastante recente. De acordo com estudiosos do assunto, a repressão sexual se diferencia no tempo e no espaço, estando articulada às formas complexas de simbolização com que diferentes culturas elaboram suas relações com a natureza. Nenhuma cultura lida com o sexo como um fato bruto, mas já o vive e compreende simbolicamente, dando-lhes sentidos, valores, criando normas, interditos e permissões.
                        Entende-se, então, que a eficácia da proibição do incesto dependerá não apenas da força das normas e dos castigos, mas de sua interiorização plena, inconsciente. Por este motivo, os estudiosos falam no tabu do incesto, isto é, na transformação do incesto em falta cuja gravidade não pode ser reparada de modo algum, senão pela morte do infrator, porque seu ato põe em risco a vida de um grupo inteiro, de uma sociedade inteira. A peculiaridade do pavor gerado pelo tabu está em que a morte do infrator, na maioria dos casos, não precisa da intervenção física ou direta do grupo, pois o transgressor morre de culpa, medo, isolamento ou loucura.
            Sob o ponto de vista jurídico, o incesto não é conduta típica no Brasil, ou seja, um filho manter relações sexuais com sua mãe, ou um pai com sua filha, não constitui crime em nosso país, se estes envolvidos forem maiores de idade. Essa atitude é repugnante e moralmente “nojenta”, porém nosso legislador silenciou-se a este respeito. Tendo em vista, o princípio de que, se algo não é proibido é permitido, vislumbra-se que o incesto pode ser praticado no Brasil sem reprimenda penal alguma. Considero um absurdo, pois nem o projeto no novo Código Penal que está em tramitação no Congresso Nacional, criminaliza o incesto. Convém lembrar que a justiça existe em função do bem-estar da sociedade e o incesto constitui-se, na realidade, em algo que traz mal-estar a esta mesma sociedade.
            Será que a sociedade não condena as relações incestuosas ou tem dificuldade de explicitar o problema e lidar com ele, pois o incesto é tratado como segredo e mantido dentro da família? Não penso assim, e a sociedade deveria se mobilizar por ocasião da iminente reforma penal, no sentido de tipificar esta conduta, seja como crime ou contravenção, para quem o praticar em nosso país, pois esta norma consuetudinária contrária às práticas usuais e imorais, já deveria ter sido positivada.

Antônio Carlos de Lima
Advogado - Jus Navigandi

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