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Amazônia - Aspectos geoeconômicos, ocupação e impactos ambientais


O avanço das queimadas é um dos principais problemas ambientais na Amazônia
A maior parte da Amazônia é a área de clima equatorial, originalmente coberta pela floresta amazônica, que cobre cerca de 40% do território brasileiro, se estendendo pela região Norte, norte do Centro-Oeste e o oeste do Maranhão, configurando a Amazônia Legal, área de atuação da SUDAM.

A - Aspectos Naturais
A maior parte da região amazônica possui clima equatorial, marcado pelas altas temperaturas o ano inteiro, tendo portanto, pequena amplitude térmica anual. A pluviosidade é imensa, geralmente ultrapassando 2500mm anuais, sem existência de estação seca no noroeste da região - área de origem da mEc, ou com uma estação seca muito curta.
O domínio climático determina a floresta mais exuberante do planeta, a Floresta Equatorial ou Latifoliada, com grande biodiversidade e enorme massa vegetal, determinando a sobreposição de vários "andares" de floresta, dando-lhe a característica fechada. A floresta Amazônica pode ser dividida em:
  • Mata do Igapó - área próxima aos rios, estando permanentemente alagada.
  • Várzea - nos trechos intermediários, possui vegetais de maior porte, como a seringueira (hevea brasiliensis), é inundada nas cheias.
  • Mata de Terra Firma - nas áreas mais distantes dos rios, com árvores muito grandes e enorme riqueza na fauna.
O desmatamento da Floresta Amazônica se intensificou a partir da década de 60 com a implantação do Programa de Integração Nacional, envolvendo a construção de eixos viários, já que as rodovias configuraram a infra-estrutura básica para os projetos de colonização. A partir daí, há a expansão da fronteira agrícola, incrivelmente com avanço da pecuária extensiva, além dos grandes projetos minerais e da ação das madeireiras nacionais, que na década de 90 passam a ter a companhia das temíveis madeireiras asiáticas.
O avanço das queimadas na Amazônia
1968 - Há duas décadas, os 5,1 milhões de km2 da Amazônia estavam praticamente intactos. Havia áreas desmatadas ao redor das cidades de Belém e Cuiabá e nas regiões sul do Mato Grosso e norte de Goiás (hoje Tocantins).
1978 - O governo decide colonizar Rondônia. As queimadas avançam para oeste ao longo da rodovia BR-364, entre Cuiabá e Porto Velho. Começam os projetos agropecuários no sul do Pará e sudeste do Maranhão.
1988 - A devastação já atinge mais de meio milhão de km2. As queimadas consumiram grande parte do Mato Grosso, Rondônia e Pará, quase todo o estado de Goiás (atual Tocantins) e Acre e Roraima.
A intensificação do desmatamento vem provocando prejuízos irreparáveis ao meio ambiente devido ao rompimento do equilíbrio ecológico, já que a retirada da floresta determina:
  1. Alterações climáticas, devido ao aumento da quantidade de carbono na atmosfera e consequentemente da temperatura e a redução da Evapotranspiração que altera os índices pluviométricos.
  2. Alterações no equilíbrio térmico, já que o desmatamento altera a umidade.
  3. Desgaste do solo, devido a intensificação da lixiviação e a não reposição do material orgânico.
  4. Falta de regulação para a rede hidrográfica.
  5. Problemas para a fauna e retirada da flora nativa para pesquisas.
Outra característica marcante do quadro natural amazônico é a rede hidrográfica, sendo a Bacia Amazônica a maior do mundo em volume de água e, provavelmente, o rio Amazonas, o mais extenso do planeta. Como o rio principal localiza-se sobre uma planície, constitui uma hidrovia de milhares de quilômetros de extensão e devido a topografia da região, já que, os seus afluentes vem de áreas mais altas, a área possui o maior potencial hidrelétrico do país, o aproveitamento porém ainda é baixo, sendo este um entrave para o desenvolvimento.

B - Aspectos Humanos
A região amazônica possui uma população absoluta muito reduzida, o que aliado a sua grande extensão, determina baixíssimas densidades demográficas. No entanto, nas últimas décadas a região vem tendo, devido as migrações, o maior crescimento populacional do país, tendo sido, na década de 80, de 4,5% ao ano contra a média nacional de l,8%.
Este grande crescimento populacional é fruto em grande parte de migrações rural-rural (expansão da fronteira agrícola), que no entanto, não impedem a região de ser predominantemente urbana, com cerca de 55% da população vivendo em cidades. Esta aparente contradição pode ser explicada pela enorme concentração fundiária e os constantes conflitos pela posse da terra, envolvendo posseiros, grileiros, latifundiários e seus jagunços, comunidades indígenas e populações extrativistas (seringueiros e castanheiros).
O principal aglomerado urbano é Belém, que é a Metrópole Regional, seguida da cidade de Manaus, que vem sendo classificada de metrópole em formação ou metrópole incompleta. Outras áreas de crescimento são Rondônia, o sul do Pará e Tocantins.

C - Aspectos Econômicos
A pecuária extensiva é uma atividade marcante na Amazônia, havendo grandes projetos ao longo das rodovias, que foram criados com incentivos diretos e indiretos do governo federal, notadamente durante a Ditadura Militar. A produtividade da pecuária na região é muito reduzida, dificilmente alcançando 50 quilos anuais por hectare e declina rapidamente, em virtude do enfraquecimento do solo (em algumas áreas da Europa a produtividade alcança 600kg/há, além de haver produção leiteira). Como entender então a existência dessa atividade?
Na verdade a pecuária extensiva é utilizada na especulação fundiária, como forma de valorização e obstáculo para a desapropriação para fins de reforma agrária.
A Ditadura Militar, citada anteriormente, é vital para a compreensão do quadro econômico amazônico, já que, a construção das "rodovias de penetração", iniciadas com a Transamazônica, e com o desenvolvimento da Cuiabá-Santarém, Cuiabá-Porto Velho e a Porto Velho-Manaus.
Apesar da enorme riqueza potencial da biodiversidade amazônica, que constitui o maior "banco genético mundial", há pequena utilização por parte do Brasil para pesquisas e desenvolvimento tecnológico (para alegria estrangeira que utiliza inclusive a "biopirataria" na área).
O extrativismo mineral merece destaque, com expressivo crescimento nas últimas décadas, principalmente com o Projeto Carajás, no sul do Pará, controlado pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), que envolveu enormes investimentos federais, incluindo uma hidrelétrica - Tucuruí no rio Tocantins, e uma ferrovia de 640 km - Estrada de Ferro Carajás. Além disso, temos a bauxita, no Pará, manganês no Amapá, ouro em várias regiões e "terras raras" na região de Roraima.
Observação: SIVAM - Sistema de Vigilância da Amazônia, monitoração via satélite, envolvendo radares fixos, móveis, sensoriamento remoto e controle de tráfego aéreo; este projeto complementa as ambições brasileiras da área do norte da América do Sul. Faziam parte do projeto de ocupação, visando o "desenvolvimento e a segurança nacional". Neste mesmo contexto da concessão de incentivos para a criação da Zona Franca de Manaus (a preocupação com a região continua sendo um assunto vital em termos de segurança, o que pode ser comprovado pelos recentes projetos SIVAM e CALHA NORTE (quartel ao longo do rio Amazonas).

IMPACTOS AMBIENTAIS DECORRENTES DA IMPLANTAÇÃO DE HIDRELÉTRICAS
A bacia hidrográfica do rio Amazonas, incluindo a bacia do rio Tocantins/Araguaia, cobre uma área de 7,1 x 106km2. A descarga média anual do rio Amazonas de 175 mil m³/sec e do Rio Tocantins/Araguaia de 11 mil m³/sec representam um potencial hidrelétrico que, até hoje, é pouco aproveitado (figura 1). No futuro, porém, esta energia será utilizada tanto para os projetos de desenvolvimento da Amazônia quanto para o abastecimento do Leste e do Sul do Brasil (STERNBERG, 1985a,b).


A avaliação do potencial hidrelétrico da bacia amazônica encontra-se atualmente ainda em estado preliminar. Para os afluentes do rio Amazonas, exceto o rio Tocantins/Araguaia, estima-se um potencial de 73,380 MW. Isso corresponde a 45% do potencial hidrelétrico de todo Brasil (figura 2). A Eletronorte (1985) menciona que 63 represas seriam necessárias para utilizar este potencial. Para a grande maioria das represas ainda faltam dados técnicos específicos. O planejamento para o uso da energia hidrelétrica do rio Tocantins/Araguaia encontra-se mais adiantado. Vinte e sete represas estão previstas para o aproveitamento do potencial hidrelétrico de 25.300 MW, correspondendo a 15% do potencial total do país (figura 3). Como estimativa geral, pode-se supor um potencial total da Amazônia em termos de 100 mil MW. Por causa do relevo pouco acidentado da região, uma área total de cerca de 100 mil km2 seria inundada em caso do aproveitamento total deste potencial.

 Em 1980, na Amazônia, somente duas pequenas represas hidrelétricas estavam em funcionamento: Curuá-Una, perto de Santarém, e Paredão, no Amapá, no norte de Belém. Ambas cobrem uma área de menos de 100 km2 e têm uma capacidade de geração de 70 MW. Os impactos econômicos e ambientais são pequenos. A situação mudou com a construção de Tucuruí no baixo Tocantins, com uma área de 2.430 km2 e uma capacidade de geração de 8 mil MW. Nos próximos anos, outras represas gigantescas serão construídas na Amazônia brasileira, estando algumas já em fase adiantada de construção, tais como Balbina, perto de Manaus, e Samuel, perto de Porto Velho. Sem dúvida nenhuma, todas estas represas trarão fortes impactos ao meio ambiente, por causa de seu tamanho.
Represas em outras regiões tropicais, por exemplo, na África, mostraram um grande número de problemas laterais negativos, os quais, na fase de planejamento, não foram previstos. Estas experiências são altamente valiosas para a Amazônia, porém, não são diretamente transferíveis, devido às diferenças fundamentais em relação às seguintes condições ecológicas gerais:
a) A maioria das represas africanas foi construída em regiões de deserto ou de savana com pouca vegetação. As represas amazônicas cobrirão áreas de densa floresta tropical.
b) As condições hidroquímicas dos rios africanos são bem diferentes das condições dos rios amazônicos, os quais são na sua maioria mais ácidos, contêm menor quantidade de sais minerais dissolvidos e têm uma composição iônica diferente.
c) A biota de ambos os continentes é diferente. Conseqüentemente, as reações de plantas e animais às mudanças ambientais, provocadas pela construção das represas, podem ser diferentes.
Por isso, as informações ecológicas existentes na própria bacia amazônica como nas áreas adjacentes têm que ser levadas em consideração prioritariamente. Estas informações, porém, são escassas, cobrindo somente alguns aspectos durante períodos curtos. Conseqüentemente, uma avaliação final sobre os impactos ecológicos das represas hidrelétricas amazônicas será possível somente após alguns anos, ou até décadas, sendo o presente trabalho sujeito a uma série de estimativas e especulações.

2. Translocação da população
Os multíplices problemas relacionados à translocação da população são tratados em uma contribuição específica neste volume.

3. Perda de solos
Por causa do relevo pouco acidentado da região amazônica, as represas a serem construídas, na sua maioria, cobrirão áreas de centenas até milhares de quilômetros quadrados com poucos metros de água. Os solos variam consideravelmente em textura e mineralogia de acordo com as condições geológicas locais. Na sua maioria, porém, eles podem ser considerados como ácidos, pobres em sais minerais solúveis e de baixa fertilidade.
As perdas de solos têm que ser correlacionadas com a produção de energia hidrelétrica. Neste respeito, existem grandes diferenças entre as represas do mundo inteiro. Uma relação muito favorável entre a área alagada e energia produzida é mostrada por Itaipu com 9 MW/km2; Tucuruí produzira 3,3 MW/km2, Balbina somente 0,1 MW/km2. Em outras represas tropicais, a variação é da mesma ordem, mostrando algumas represas muito grandes da África, como, por exemplo, o lago Volta no rio Volta (Ghana) e o lago Karíba, no rio Zambesi (Zimbabwe/Zambia), valores tão baixos como os de Balbina.
A questão da perda de minerais tem que ficar até certo ponto em aberto. Em algumas áreas, diamantes (por exemplo Tucuruí) e ouro (por exemplo Balbina) foram descobertos. A quantidade total parece ser baixa. Considerando, porém, o baixo nível de conhecimento sobre a geologia e mineralogía da região, restam, pelo menos, dúvidas em termos de possíveis perdas de valiosos recursos minerais por causa da inundação.

 4. Perdas de espécies de plantas e animais
A maioria das áreas a serem inundadas é coberta por densa floresta tropical, por exemplo, Balbina e Cachoeira da Porteira. Em Tucuruí e Samuel, cerca da metade da área estava coberta por floresta secundária, pastagens e pequenas parcelas cultivadas. A floresta tropical sempre úmida é considerada o ecossistema mais rico em espécies no planeta, sendo a maioria delas desconhecida pela ciência.
Amplos inventários botánicos e zoológicos foram feitos em Tucuruí. Deve-se considerar, entretanto, que a área a ser levantada era muito grande, a flora e a fauna demasiadamente diversificadas, o número de especialistas envolvidos insuficiente e o tempo curto demais para chegar a um nível satisfatório de conhecimento. Resta somente a esperança de que existam áreas de distribuição suficientemente amplas fora de Tucuruí, para que seja garantida a sobrevivência das espécies afetadas. Considerando a grande extensão de Tucuruí e das outras represas, perdas de espécies sao prováveis, porém não podem ser comprovadas definitivamente por falta de informações mais detalhadas.
Durante o represamento, a Eletronorte fez grande esforço para salvar os animais atingidos pelas águas (operação Curupira). Porem, resta em aberto a questão a respeito do valor de tal ação. Sem dúvida nenhuma, populações pequenas, restritas a áreas limitadas, podem ser salvas, quando existirem habitats adequados e livres à disposição, para onde os animais possam ser transferidos. Em geral, porém, o represamento resulta na transferência ou na migração de animais para áreas já ocupadas, provocando uma superpopulação temporária e um stress para o sistema inteiro. No melhor dos casos, isso pode resultar num aumento das populações anteriormente reduzidas por caçadores. Estas populações, porém, serão reduzidas rapidamente nos anos seguintes, se não se exercer um controle rígido dos caçadores e uma proteção dos habitats naturais ao redor das represas. No pior dos casos, o acesso fácil para áreas anteriormente inacessíveis e não-colonizadas nas beiras das represas acelerará a exploração indiscriminada de recursos naturais. A destruição da floresta aumentará se não tiver uma legislação protetora e reguladora rigorosamente observada. Tais providências não foram tomadas até agora de uma maneira adequada. Atualmente não existem programas de resgate para outros reservatórios em construção.
Algumas represas e linhas de transmissão afetam direta ou indiretamente reservas biológicas e indígenas, ou áreas que são consideradas de valor a serem preservadas, como mostra Goodland (1978) para Tucuruí. Obviamente a preocupação em relação a estes impactos é limitada.
A formação de lagos artificiais permanentes, grandes e fundos, numa área onde tais habitats não ocorrem naturalmente, pode ser considerada um aumento de nichos ecológicos para a flora e fauna aquática. Observações no reservatório de Brokopondo, porém, não apóiam esta consideração. Mesmo 20 anos depois do represámento, o reservatório é relativamente pobre em plantas e animais e sem maior beleza. Os habitats artificiais novos, obviamente, não compensam a perda dos habitats naturais (LEENTVAAR, 1984).

5. Perdas de monumentos naturais e históricos
Nas áreas das represas atualmente em construção não existem monumentos naturais considerados sem par ou de beleza excepcional. Monumentos históricos espetaculares, tais como aqueles que foram ameaçados pela construção da represa de Aswan no rio Nilo, não existem na área por causa de sua história cultural. Porém, existem muitos pequenos lugares de importância arqueológica na área toda, especialmente ao longo dos cursos dos rios, que serão perdidos por causa da falta de conhecimento sobre a sua localização e o difícil acesso à área.

6. Perda de recursos madeireiros
A quantidade de madeira de Valor comercial na floresta natural é estimada entre 40 e 60 m³/ha. Mostra-se, porém, que os problemas técnicos, infra-estruturais, organizacionais e de mercado internacional, que resultam do tamanho enorme da área e da diversidade grande das espécies madeireiras, eram até hoje grandes demais para serem resolvidos de uma maneira adequada. A agência governamental Capemi, responsável pelo desmatamento de Tucuruí, desistiu do empreendimento com grandes perdas. Para a área de Balbina ainda não se conhecem empresas interessadas. O tempo disponível já é insuficiente para um desmatamento adequado. Atualmente, uma parte da madeira de Balbina é usada para produzir a energia termelétrica necessária para a construção da represa. É planejada a implantação de mais duas termelétricas na base de lenha picada, de 25 MW cada uma.
Mesmo construindo somente algumas das represas planejadas, alguns mil quilômetros quadrados da floresta amazônica serão inundados no futuro próximo. A utilização destes recursos madeireiros pode ser considerada um dos grandes desafios técnicos e econômicos da região amazônica.

7. Modificações da geometria hidráulica do rio
Todos os rios tendem a atingir um equilíbrio dinâmico entre a sua descarga, velocidade média, carga sedimentar e a morfología de seu leito. A combinação destes fatores constitui a geometria hidráulica do rio (LEOPOLD e MADDOCK, 1953). Plantas e animais aquáticos são adaptados a estas condições específicas. O represamento de um rio significa uma interrupção de um sistema aberto e de transporte por um sistema mais fechado e de acumulação. Conseqüentemente, a construção de uma represa representa um impacto fundamental para a geometria hidráulica de um rio, resultando em fortes modificações hidrológicas, hidroquímicas e hidrobiológicas, que não somente afetam a área do próprio reservatório, mas também a área abaixo da represa e, no caso da biota, até a área acima dela.

7.1. Modificações na hidrologia
A finalidade da construção de uma represa hidrelétrica é a de aproveitar água de alto desnível em quantidade constante durante o ano todo. A represa nivela as flutuações naturais da descarga do rio. Conseqüentemente, as flutuações do nível do rio abaixo da represa são modificadas. Rios com alta descarga, por exemplo o rio Tocantins, são influenciados de tal modo que níveis extremamente baixos e, até certo ponto, extremamente altos são evitados. O tempo de retenção, ou seja, o tempo teórico de troca do volume total da água de Tucuruí é durante a enchente somente de 2-3 semanas. Conseqüentemente, o padrão natural do ciclo hidrológico abaixo da represa será mantido com uma amplitude reduzida, porque a descarga do rio Tocantins durante a cheia é grande demais para ser estocada na represa. Rios com descarga pequena, por exemplo o rio Uatumã, vão perder seu padrão natural de descarga abaixo da represa, porque a capacidade de estocagem do reservatório é suficientemente grande para controlar a descarga completamente.
A eliminação das inundações no rio Nilo em conseqüência da construção da barragem de Aswan resultou na queda de fertilidade e no aumento da salinidade dos solos abaixo da barragem (RZOSKA, 1976). Tais problemas são de baixa importância para a maioria dos rios amazônicos selecionados para a produção de energia hidrelétrica. Estes pertencem aos tipos de rios de água clara e de água preta que possuem áreas alagáveis de baixa fertilidade natural e baixo potencial agrícola. Um aumento da salinidade dos solos não ocorrerá por causa das baixas concentrações de sais minerais nos solos e na água e por causa da alta precipitação anual.
7.2. Modificações da carga sedimentar
A redução da correnteza resulta na deposição dos sedimentos dentro dos reservatórios. A carga sedimentar relativamente baixa de rios de água clara e água preta garante aos reservatórios hidrelétricos amazônicos teoricamente uma vida útil de centenas de anos. Porém, deve-se salientar que estes tipos de rios são pobres em sedimentos por causa de uma floresta densa e quase contínua, que cobre as bacias hidrográficas e protege os solos contra a força erosiva de cerca de 2 mil mm/a de chuva. Exatamente esta proteção será eliminada em grande escala, por causa dos grandes projetos de mineração, industriais e agropecuários a serem implantados em conseqüência da disponibilidade da energia hidrelétrica. Por isso, a erosão pode aumentar facilmente de 10 a 100 vezes, como foi mostrado em estudos realizados nos EUA (WARK e KELLER, 1963; WOLMAN, 1964; WAHRHAFTIG e CURRY, 1967). Sem medidas rígidas e amplas para um controle da erosão em toda a bacia hidrográfica, a vida útil real das represas poderá reduzir-se drasticamente.
A erosão lateral dos reservatórios pode acelerar mais o seu aterro se não existir vegetação protetora nas margens. Os reservatórios amazônicos são bastante rasos. Flutuações do nível da água de poucos metros resultarão em inundação ou seca de centenas de quilômetros quadrados. A diferença de 4 m entre a quota 46 m e a quota máxima de 50 m de Balbina afeta cerca de 800 km2 de floresta. Existem na Amazônia muitas espécies arbóreas resistentes a inundações periódicas. O processo de colonização, porém, é demorado e necessitara décadas se não for acelerado pelo homem. Experimentos de germinação estão sendo financiados pela Eletronorte. Porém, não se pode dizer até que ponto as espécies podem tolerar o ciclo hídrico artificial dos reservatórios.
A deposição dos sedimentos dentro dos reservatórios não somente reduz a sua vida útil, mas aumenta também a erosão no vale abaixo das represas, até chegar de novo ao equilíbrio determinado pela geometria hidráulica do rio. Este efeito pode até afetar o delta dos rios como ocorreu no rio Nilo. Quando o transporte de água e de sedimentos através do rio Nilo para o Mediterrâneo foi interrompido, devido à construção da represa de Aswan, começou logo a erosão do delta pelo mar.
Os rios da Amazônia selecionados para a construção de represas hidrelétricas têm, na sua maioria, uma carga sedimentar relativamente baixa e, com ela, faixas aluvionais (várzeas ou vargens) pequenas. Por isso, a erosão das beiras de solos friáveis ocorrerá somente em pequena escala. Uma exceção pode ser o rio Madeira, rio de água branca, rico em sedimentos. A sua várzea no curso inferior, bastante estreita, pode ser sujeita a fortes modificações por erosão em caso da construção de uma barragem.
7.3. Mudanças florísticas e faunísticas abaixo e acima da represa
Mudanças no regime hídrico influenciam fortemente a flora e a fauna adaptada a determinadas flutuações do nível e da correnteza. Nos trópicos, até agora, existem poucas informações sobre mudanças florísticas abaixo de represas, porque comunidades naturais foram pouco utilizadas pelo homem e, conseqüentemente, pouco estudadas. Levando em conta as experiências de regiões temperadas, supomos que as espécies resistentes contra inundações periódicas serão substituídas por espécies de áreas não-inundáveis. Plantas herbáceas vão reagir muito mais rapidamente do que árvores por causa de seu ciclo de vida mais curto.
Como exemplo do impacto negativo do controle da descarga para a fauna abaixo do reservatório podem servir as grandes tartarugas. Elas desovam nas praias (tabuleiros) durante a seca. Os tabuleiros mais importantes no baixo rio Amazonas encontram-se no baixo rio Trombetas, abaixo da represa Cachoeira da Porteira, atualmente em planejamento. Há alguns anos, estes tabuleiros são estritamente protegidos pelo IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal) e têm o status de uma reserva biológica. Supõe-se que, pela mudança do regime hidrológico, os tabuleiros serão afetados de uma tal maneira que a população das tartarugas será drasticamente reduzida, pondo em risco a finalidade principal de uma das poucas reservas biológicas amazônicas bem estabelecidas e bem protegidas.
Mudanças hidrológicas e florísticas dentro das áreas alagáveis têm impactos grandes para as redes alimentícias, tanto no rio quanto nas áreas de terra firme adjacentes e podem resultar em modificações grandes na biocenose. Nas savanas da África, os animais de caça invadem durante a seca as áreas alagáveis dos rios, por exemplo do rio Kafue, na Zâmbia (WERGER e ELLENBROEK, 1980), para comer os capins aquáticos e palustres de alto valor nutritivo. No caso do controle das inundações por uma represa, os capins resistentes a inundações iriam ser substituídos por capins de savana com baixo valor nutritivo durante a seca. Em conseqüência, a oferta de alimento seria reduzida fortemente na fase mais critica, diminuindo desta forma a capacidade de sustentação (currying capacity) do sistema inteiro.
Na Amazônia, a migração de animais de caça da terra firme para as várzeas e igapós é pouco desenvolvida por causa do número menor de espécies. Porém, existem migrações laterais de numerosas espécies aquáticas, por exemplo peixes, tartarugas, jacarés, peixes-boi, etc., entre os rios e as áreas alagáveis. A capacidade de sustentação do sistema rio/várzea ou igapó, respectivamente, depende da fertilidade da água e dos solos e do tamanho da área alagada (WELCOMME, 1979). A produção íctica/ha em áreas alagáveis grandes é maior de que em áreas alagáveis pequenas de fertilidade igual. Pode-se, por isso, supor que a redução da área alagável abaixo da represa em conseqüência da mudança do regime hídrico não somente modificará a composição da flora e fauna em termos de espécies, mas também diminuirá a produtividade do sistema inteiro.
A ictiofauna será modificada abaixo da represa, dentro da mesma e acima dela. A grande maioria das espécies ícticas de valor para o consumo humano são espécies migratórias (espécies de piracema). Elas realizam grandes migrações durante as quais o desenvolvimento gonadal na sua fase final é estimulado. Além das migrações de desova, elas fazem migrações tróficas rio acima, pelas quais o transporte dos ovos e das larvas rio abaixo é compensado. Para elas, as barragens representam um obstáculo insuperável. Como foi mostrado em Curuá-Una e Tucuruí, as populações de muitas espécies migratórias serão fortemente reduzidas ou extintas no reservatório e até acima dele (VIEIRA, 1982; HOLANDA, 1982; FERREIRA, 1984 a).
Muitas destas espécies são detritívoras ou parcialmente herbívoras. Ambos os itens alimentares encontram-se em grandes quantidades nos reservatórios, mas provavelmente não serão utilizados adequadamente por falta de um número suficiente de espécies e espécimes adaptados. Estudos em Curuá-Una mostram que, alguns anos depois do represamento, nenhuma das espécies que ocorrem na represa foi capaz de aumentar a sua população de um modo tal que substituísse as espécies previamente eliminadas (FERREIRA, 1984 b).
O problema poderia ser resolvido em parte pela construção de escadas de peixes. Tais escadas existem no Brasil até hoje somente em número pequeno. Godoy (1985) menciona 35 escadas, sendo a maioria delas de tamanho pequeno, ultrapassando somente uma diferença de menos de 10 m de altura. Uma escada de peixes de maior porte (20 m) está atualmente em construção no rio Paraná (ilha Grande). A Eletronorte não planeja a construção de escadas de peixes nas barragens da Amazônia.

7.4. Impactos para a pesca e a aqüicultura
Apesar da redução das áreas alagáveis em tamanho e em fertilidade pela construção de uma represa, a produção íctica do sistema inteiro pode ser mantida, como no rio Nilo. A queda drástica da captura no curso inferior e no delta foi compensada pela captura no próprio reservatório. Compensações similares são estimadas para as represas Pa Mong, no rio Mekong, e Kainji, no rio Niger (WELCOMME, 1979).
O problema de uma possível redução dos estoques de peixes migratórios em rios amazônicos por causa das represas já foi mencionado. Além disso, a produção pesqueira em represas grandes baseia-se freqüentemente em espécies pelágicas. Em reservatórios africanos, por exemplo no lago Kariba, a pesca no pelagial contribui atualmente com cerca de 90% da captura total (GLIWICZ, Univ. Varsóvia, Polônia, com. pess.). Isso, porém, só foi possível por causa da introdução de uma espécie pelágica, a sardinha do lago Tanganjika, Limno-thrissa miodon. A questão da existência ou não de espécies apropriadas na Amazônia fica em aberto. Além disso, a fertilidade dos rios amazônicos de água preta e água clara é bem inferior àquela de rios africanos, sendo a produção no pelagial bastante reduzida, como mostram estudos sobre a densidade do zooplâncton em Curuá-Una (ROBERTSON, 1980).
A legislação brasileira exige das companhias construtoras de represas a passagem livre de animais aquáticos em rios, seja através da construção de escadas de peixes, seja através de um povoamento dos reservatórios com alevinos de espécies ícticas de valor comercial. Como a construção de escadas de peixes não está prevista pela Eletronorte, a produção de alevinos nas estações de aquicultura terá importância crescente. Isso traria um impacto positivo para o desenvolvimento da aquicultura de iniciativa privada na Amazônia, que atualmente existe somente em forma rudimentar. O potencial da pesca interior nas águas amazônicas ainda permite um aumento da captura (BAYLEY, 1981), sendo os seus limites, porém, visíveis para o fim deste século. Por isso, a aquicultura terá no futuro um papel cada vez mais importante na Amazônia (JUNK, 1984). Até que ponto a construção e manutenção de estações de aqüicultura será realizada pela Eletronorte fica ainda para ser determinado.
A pesca em reservatórios amazônicos pode sofrer um problema adicional por uma infestação maciça de peixes com parasitas. Poucos anos depois do represamento do rio Curuá-Una, os peixes (por exemplo Cichla ocellaris) capturados no reservatório mostraram uma taxa tão alta de infestação com nematódeos que a população local quase parou de pescar e comer peixe (FERREIRA, com. pess.). Não se sabe ainda até que ponto isso foi um problema local e temporário de Curuá-Una.
Considerando todas estas dúvidas, existem atualmente somente estimativas da produção íctica dos reservatórios a serem construídos e da importância socioeconómica das atividades pesqueiras relacionadas. Em Sobradinho, no rio São Francisco, a captura média de 1979/1980 era de 35 kg/ha (PAIVA, 1982). Na Amazônia, a baixa fertilidade da água, os problemas com a produção e estocagem de alevinos e a possível falta das espécies pelágicas, porém, sugerem capturas menores. Baseando-se em dados disponíveis sobre a produção primária e secundária de águas naturais amazônicas, uma estimativa a longo prazo de 20-40 kg/ha/ano parece ser realística depois de uma fase inicial de produção superior. Tucuruí deveria produzir perto de 40 kg/ha, enquanto os valores de Balbina deverão ser menores. Conseqüentemente, a contribuição dos reservatórios amazônicos ao abastecimento da população com proteína será somente de importância local.
7.5. Crescimento maciço de macrófitas aquáticas
Um dos fenômenos biológicos mais alarmantes em represas tropicais é o desenvolvimento em massa de macrófitas aquáticas. A maioria das represas africanas e asiáticas foram afetadas, como também a represa de Brokopondo no Suriname. Muitos problemas estão relacionados com o desenvolvimento em massa de macrófitas aquáticas, por exemplo o aparecimento de doenças (Schistosomíasis), a deterioração da qualidade da água pela grande produção e a decomposição de matéria orgânica, o impedimento da pesca e do tráfego, o entupimento de canais de irrigação, a interferência em plantações, por exemplo de arroz, o aumento da evapotranspiração, o impedimento de atividades turísticas, etc.
Vários fatores são necessários para permitir o crescimento maciço de macrófitas aquáticas:
a) alta capacidade reprodutiva das plantas,
b) alto nível de nutrientes,
c) condições climáticas favoráveis,
d) falta de espécies competidoras,
e) falta de animais herbívoros, pragas e doenças.
Algumas das espécies mais daninhas em represas africanas e asiáticas são endêmicas na América do Sul tropical, por exemplo Eichhornia crassipes e Salvinia auriculata (Salvinia molesta, da represa Kariba, foi descrita mais tarde como espécie nova com reprodução exclusivamente vegetativa).
A alta capacidade reprodutiva de muitas plantas aquáticas da Amazônia é explicada provavelmente pelo fato de que elas crescem nas várzeas dos grandes rios sujeitos a altas flutuações do nível da água. Grandes perdas periódicas durante a seca favoreceram a seleção genética para altas taxas de reprodução que foram conseguidas principalmente por reprodução vegetativa. A condição principal para o aproveitamento máximo desta capacidade é a disponibilidade de nutrientes. Nas águas brancas da Amazônia em condições nutritivas favoráveis, Salvinia auriculata e Eichhornia crassipes mostram um crescimento exponencial com um período de duplicação de 6-8 dias (JUNK e HOWARD-WILLIAMS, 1984). Valores similares foram medidos em reservatórios africanos (MITCHELL e TUR, 1975; BOND e ROBERTS, 1978). Nos lagos das áreas alagáveis dos rios amazônicos de água clara, o crescimento das plantas é fortemente reduzido por falta de nutrientes. Em rios e lagos de água preta, estas plantas normalmente não ocorrem, por causa do baixo teor de nutrientes, provavelmente em combinação com a alta acidez da água (BERG, 1961).
O represamento de um rio num reservatório novo normalmente leva a um aumento considerável do teor de nutrientes por causa da lixiviação do solo inundado e da decomposição da vegetação terrestre afogada. Isto pode aumentar a concentração dos nutrientes até um ponto que acarreta o crescimento maciço de macrófítas aquáticas, se existirem espécies adequadas presentes, como demonstrado em Curuá-Una.
A área influenciada pelas águas do rio Curuá-Una foi pesadamente infestada por Eichhornia crassipes, Scirpus cubensis, Pistia stratiotes e, em quantidade inferior, por Paspalum repens. Animais herbívoros, parasitas e doenças não foram capazes de controlar o crescimento, e da competição somente resultou a substituição de uma planta daninha por outra. Em 1979, as plantas cobriram 27% da superfície. As áreas diretamente influenciadas pelas águas extremamente ácidas e pobres em nutrientes dos afluentes Mojuí e Moju não foram colonizadas, apesar de uma infestação permanente por plantas carregadas pelo vento (JUNK, 1982). Depois de 1979, o crescimento reduziu-se por causa da diminuição de nutrientes, que resultou do curto período de retenção da água no reservatório. Atualmente, somente pequenas quantidades de macrófítas aquáticas estão presentes em Curuá-Una.
Um padrão similar de desenvolvimento foi registrado em outras represas tropicais. No lago Kariba, durante o desenvolvimento máximo, Salvinia molesta cobriu 22% da área, correspondendo a 1 mil km2 (MITCHELL & TUR, 1975). Atualmente, somente 3% da superfície estão cobertos com tendência a diminuir ainda mais (KRONBERG, Univ. Lund, Suécia, com. pess.). No reservatório de Brokopondo, Suriname, em condições hidroquímicas similares às da Amazônia, houve um crescimento maciço de Eichhornia crassipes e Ceratopteris pteridoides logo depois do represamento (DONSELAAR, 1968). Eichhornia, foi eliminada com herbicidas (2,4,D). Ceratopteris sumiu ao mesmo tempo (LEENTVAAR, 1973). De acordo com o nosso conhecimento atual, as plantas teriam desaparecido de qualquer modo sem aplicação de herbicidas, devido à falta de nutrientes. O fato de que as plantas não reaparece indica a continuação das condições hidroquímicas desfavoráveis. O reservatório de Guri, na Venezuela, não mostrou na primeira etapa de represamento qualquer problema com macrófitas aquáticas. Um desenvolvimento maciço foi registrado logo depois da segunda etapa, quando áreas grandes de floresta foram alagadas. Em Tucuruí, um crescimento maciço de Salvinia auriculata começou logo depois do represamento em 1985. Depois de alguns meses de crescimento, as plantas desapareceram e começaram a reaparecer na época chuvosa em 1986.
Podemos resumir que, de acordo com o nosso conhecimento atual, as represas amazônicas construídas em rios de água clara e água preta podem ser afetadas por macrófitas aquáticas durante e logo depois do represamento. Porém, depois de um período de alguns meses até poucos anos de crescimento intensivo, dependendo da disponibilidade de nutrientes no reservatório, o número das plantas diminuirá fortemente. As plantas podem desaparecer completamente em reservatórios de água preta, ou ocupar pequenas áreas protegidas contra o vento nos de água clara. Um crescimento mais forte pode ocorrer perto dos afluentes por causa do melhor abastecimento com nutrientes e em áreas poluídas onde as plantas podem localmente criar problemas. Reservatórios construídos em rios de água branca, ricos em nutrientes, por exemplo o rio Madeira, podem ser considerados altamente problemáticos em termos do permanente crescimento maciço de macrófitas aquáticas.
Qualquer discussão sobre o controle químico de macrófitas aquáticas tem que levar em conta que operações contínuas serão necessárias enquanto existirem nutrientes em quantidade suficiente à disposição das plantas. Considerando o tamanho dos reservatórios e o crescimento rápido das plantas, tais operações serão muito custosas, necessitando muita mão-de-obra, e poderão, a longo prazo, intoxicar o ecossistema, inclusive o homem.
7.6. Deterioração da qualidade da água
Águas paradas nos trópicos quentes mostram em geral uma hipoxia forte ou até anoxia nas camadas profundas, apesar de uma termoclina pouco pronunciada. Isto se deve ao fato de que a solubilidade de oxigênio na água diminui com o aumento da temperatura, enquanto que os processos de decomposição que consomem oxigênio se aceleram. Represas tropicais mostram este padrão especialmente bem durante os primeiros anos depois do represamento, porque têm à sua disposição, nas áreas recentemente inundadas, grandes quantidades de matéria orgânica facilmente degradável. Dependendo do tipo de vegetação, em áreas cobertas por savanas, a biomassa pode variar entre 10 e 100 t/ha de matéria seca, enquando na floresta amazônica o valor chega a 600 t/ha. Uma parte considerável deste material, por exemplo folhas, plantas herbáceas e capins decompõem-se em poucas semanas ou meses; madeira leve necessita alguns anos, enquanto madeira dura e pesada podem resistir décadas até centenas de anos debaixo da água.
Conseqüentemente, a demanda bioquímica de oxigênio é muito alta durante e pouco depois do represamento, diminuindo nos anos seguintes com a diminuição do material fácil a decompor-se. Os nutrientes liberados em conseqüência da decomposição e lixiviados do solo inundado são usados pelo fitoplâncton, perifíton e macrófitas aquáticas, que produzem de novo material de fácil decomposição. Enquanto o fitoplâncton e perifíton liberam oxigênio para dentro da água, as macrófitas aquáticas flutuantes e emergentes contribuem somente com pouco ao mesmo, porque o oxigênio produzido é liberado na sua maior parte para o ar. Além disso, macrófitas aquáticas flutuantes reduzem as turbulências provocadas pelo vento, diminuindo o intercâmbio de gases entre a água e o ar. Conseqüentemente, uma forte hipoxia e a formação de gás sulfídrico nas camadas inferiores são freqüentes em represas tropicais. A mortalidade de peixes que ocorre sempre no começo do represamento é devida à falta de oxigênio para as espécies acostumadas a água corrente e bem oxigenada.
Cálculos preliminares em Curuá-Una mostram que a maior parte do oxigênio entra no reservatório pelos afluentes. Conseqüentemente, a extensão da camada anóxica e o tempo de existência dela são fortemente influenciados pelo tempo de retenção da água no reservatório. Um gradiente horizontal de oxigênio do afluente para o efluente é um fenômeno freqüentemente encontrado em represas tropicais, como também mostrado no reservatório de Brokopondo (VAN DER HEIDE, 1982). Medidas e cálculos para Curuá-Una durante o terceiro ano após o represamento mostraram que, em períodos de retenção de mais que 30 dias, o gás sulfídrico começou a aparecer no fundo, perto da barragem (JUNK at al. 1981; DARWICH, 1982). Tucuruí mostrou anoxia no fundo durante a estiagem. O oxigênio reapareceu durante a época chuvosa devido ao alto fluxo da água, variando o período de retenção entre poucas semanas na época chuvosa e alguns meses na época de estiagem. A concentração de oxigênio em Tucuruí aumentará ainda consideravelmente nos próximos anos com a diminuição da quantidade do material orgânico facilmente oxidável. Reservatórios com prolongados períodos de retenção, tais como Balbina, sempre sofrerão hipoxia nas camadas inferiores.
Além do impacto negativo para a biota, a má qualidade da água afeta as turbinas e as construções, criando gastos elevados de manutenção. Após poucos anos de funcionamento, peças das turbinas de Curuá-Una tinham que ser substituídas por causa da corrosão. O sistema de refrigeração foi bloqueado por causa de um desenvolvimento em massa de bactérias, forçando a parada temporária das turbinas.
7.7. Problemas sanitários
Problemas sanitários em reservatórios são normalmente relacionados com esgotos ou com parasitas, cujos hóspedes intermediários pode estabelecer-se e proliferar com sucesso no novo meio ambiente. Além disso, pode haver problemas com número.elevado de mosquitos (Cullex spp.), ou com o mal cheiro de gás sulfídríco. Doenças intestinais, provocadas pelo consumo de água poluída, são freqüentemente relacionadas com um tratamento inadequado de esgotos. Ocasionalmente, o crescimento maciço de algas cianofíceas e a decomposição de macrófitas em grande escala podem deteriorar a qualidade da água e provocar problemas gastrointestinais, um aumento da malária foi reportado em várias represas tropicais (BROWN e DEOM, 1973). Moléstia pelo aumento de mosquitos foi observada em Curuá-Una.
Na Amazônia, uma das maiores preocupações existentes diz respeito ao aparecimento da Schistosomíasis nas represas. Esta doença, muito problemática, já atinge amplamente o Nordeste do Brasil e em Minas Gerais. A condição básica para o estabelecimento da doença é a existência de moluscos planorbídeos do gênero Biomphalaria nas represas. Eles não ocorrem em águas ácidas e pobres em cálcio, típicas dos rios de água preta. Em rios de água clara, menos ácidos e mais ricos em cálcio, eles podem existir. Em rios com água branca, eles são muito freqüentes quando macrófitas aquáticas oferecem boas condições para o seu desenvolvimento. Em Curuá-Una, uma espécie de Biomphalaria foi encontrada em baixo número entre as macrófitas. O rio Tocantins/Araguaia tem águas neutras e relativamente ricas em cálcio (SANTOS, 1984). O rio é colonizado por muitos moluscos, tanto biválvios quanto caramujos. Biomphalaria não foi encontrado até agora, porém existe naquela bacia hidrográfica (GOODLAND, 1978). Não existem até agora relatórios de casos autóctones de Schistosomíasis como conseqüência da construção das represas. Porém, existem em Tucurui tanto as condições hidroquimicas para o crescimento dos moluscos quanto as possibilidades de infestação com o parasita, por causa do alto fluxo não-controlado da população.

8. O impacto ao balanço global de CO2
Meteorologistas, físicos e ecólogos, com crescente preocupação, chamam a atenção para o perigo de uma mudança global do clima em conseqüência do aumento de CO2 na atmosfera, por causa da queima de combustíveis fósseis e da destruição das florestas tropicais em grande escala. O cenário delineado a esse respeito é alarmante para a humanidade e pode tornar-se realidade, já no próximo século, se a emissão de CO2 não for reduzida consideravelmente. Por isso, uma avaliação do papel das represas hidreléticas em relação ao balanço de CO2 é de grande importância.
A construção da represa de Tucuruí ocupa uma área de 2.430 km2, sendo cerca da metade coberta com floresta. Estima-se um valor médio de 300 t/ha de matéria orgânica seca para a área inteira. Isso corresponde a 72,9 x 106 t de matéria orgânica e, respectivamente, 36,45 x 106 t de carbono para a área desta represa. Simplificando, supõe-se que no decorrer do tempo todo este carbono seja transferido para a atmosfera em forma de CO2. Uma quantidade equivalente de carbono é emitida para a atmosfera quando se queima 45,6 x 106 t de óleo diesel. Supondo 10.900 kcal/kg de óleo diesel e uma taxa de aproveitamento de 20% em forma de energia elétrica numa usina termoelétrica, a queima de 45,6 x 106 t de diesel produz 8 mil MW durante um período de cerca de 1,5 anos. Em relação ao balanço de CO2, a construção de Tucuruí compensará tal produção já depois de 1,5 anos, se trabalhar com toda a capacidade.
Esta estimativa tem falhas, porque não leva em consideração a destruição acelerada da floresta em conseqüência da existência e do funcionamento da usina, que pode ultrapassar consideravelmente a área da própria represa. Além disso, supunha-se a utilização da capacidade total que, na realidade, será efetivada somente em alguns anos. Considerando, por isso, nos cálculos uma área adicional de floresta virgem cinco vezes maior do que a da represa de Tucuruí, com 600 t/h de matéria orgânica e a utilização de 50% (= 4 mil MW) da capacidade total, o balanço de CO2 começa a ser positivo cerca de 37 anos depois da construção. Considerando a vida útil do reservatório, este valor indica um impacto positivo ao meio ambiente.
Fazendo os mesmos cálculos para Balbina (mesma área de reservatório completamente coberta com floresta, capacidade total de 250 MW), o balanço de CO2 começa a ficar positivo para a área do reservatório sem destruição adicional de floresta somente depois de 107 anos. A instalação prevista de duas usinas termelétricas de 25 MW cada uma, usando madeira picada dos arredores da represa, deteriora o resultado ainda mais. Por isso, Balbina não pode ser considerada positiva em relação ao balanço de CO2.

9. Avaliação geral e recomendações
Em conseqüência de decisões políticas tomadas anos atrás sobre os grandes projetos na bacia amazônica as possibilidades reais de implantação desses projetos, respeitando as necessidades ecológicas, são remotas. Este é um problema geral no mundo inteiro: engenheiros têm vários anos e bastante dinheiro à disposição para realizarem estudos sobre as alternativas técnicas, a fim de resolver um dado problema. Ecólogos, porém, são chamados somente quando as decisões já foram tomadas sob aspectos técnicos, econômicos e políticos. O ecólogo fica na situação incômoda de constatar os fatos consumados, criticá-los e tentar reduzir dentro do possível os impactos negativos. Conseqüentemente, as possibilidades para uma colaboração eficaz entre engenheiros, políticos e ecólogos são bastante reduzidas.
Para evitar outras decisões duvidosas, torna-se necessária uma rediscussão das prioridades em relação à construção de represas e linhas de transmissão, através de engenheiros e especialistas de alto nível de outras áreas ligadas ao problema.
Considerando os fatos e argumentos anteriormente discutidos, a utilização de energia hidrelétrica para a realização dos projetos de desenvolvimento na Amazônia pode ser recomendada, porém, com uma série de restrições.
Deve-se enfatizar que muitos dos reservatórios planejados vão provocar tantos impactos negativos ao meio ambiente que a sua construção não é recomendável. Enquanto, por exemplo Tucuruí pode ser considerada uma alternativa aceitável em comparação com outras soluções, para satisfazer a demanda de energia elétrica (usinas termelétricas ou termonucleares), a construção de Balbina tem que ser considerada um projeto que não compensa os danos infligidos ao meio ambiente. Por causa da sua baixa capacidade total, Balbina não vai satisfazer a demanda de energia elétrica de Manaus e do seu pólo industrial, nem garantir o futuro desenvolvimento da região.
A longo prazo, o abastecimento da Amazônia com energia elétrica e o seu transporte para o Nordeste e Sul do país vai requerer a construção de uma rede de linhas de transmissão, que em parte já foi planejada pela Eletronorte. Manaus, por exemplo vai necessitar a longo prazo de uma linha de transmissão, ou de Cachoeira da Porteira, ou de Tucuruí, ou de uma outra represa de alta potência, além da construção de Balbina. Por isso, a produção de energia hidrelétrica poderia ser concentrada em poucas bacias hidrográficas bem apropriadas. A bacia dos rios Tocantins/Araguaia, por exemplo já foi prevista para a construção de muitos reservatórios. Valeria a pena avaliar a viabilidade econômica de dar-se prioridade para a construção dessas represas e selecionar mais uma ou duas bacias apropriadas em outra parte da Amazônia, distribuindo de lá a energia para os locais de consumo, em vez de construir represas isoladas em todos os afluentes. Isto concentraria os impactos ecológicos e reduziria o total dos efeitos negativos para o meio ambiente. Além disso, a Eletronorte iria usufruir de uma série de vantagens de tal política, tais como um aproveitamento melhor da água estocada, aumento do tempo útil das represas por causa da melhor distribuição dos sedimentos, melhor controle da inundação, melhoramento do tráfego naval e melhor controle da imigração humana, controle da erosão e poluição em somente poucas bacias hidrográficas, monitoramento de fatores hidrológicos, hidroquímicos e hidrobiológicos em somente poucos rios, etc. Apesar das perdas de energia em conseqüência do transporte sobre longas distâncias, a concentração da produção de energia em poucas bacias apropriadas poderia ser uma alternativa economicamente viável e ecologicamente recomendável em comparação com o conceito atual.
Além disso, deve-se enfatizar que a construção de represas hidrelétricas grandes não resolve o problema energético da Amazônia em geral, mas somente aquele dos centros urbanos e industriais. Atualmente, existe o perigo de que as fascinantes possibilidades tecnológicas de grandes projetos industriais e de mineração se sobreponham às necessidades energéticas das áreas rurais. O desenvolvimento de tecnologias funcionais, baratas e adequadas para o abastecimento de pequenas comunidades rurais com energia elétrica (por exemplo miniusinas hidrelétricas) e sua ampla distribuição é fundamental para o melhoramento da infra-estrutura rural. Uma infra-estrutura adequada, porém, é necessária para estabelecer a longo prazo uma agricultura efetiva e produtiva, que é essencial para o abastecimento dos centros urbanos e industriais existentes e em planejamento. Se isso não for possível, surge o grande risco de uma migração acelerada da população rural para os centros urbanos e industriais, onde altos preços para itens alimentares básicos, importados de longas distâncias, e altas taxas de desemprego podem resultar em sérios problemas socioeconómicos. A Amazônia iria escapar da crise energética, freqüentemente citada, para passar diretamente à crise alimentícia e à crise de empregos nos centros urbanos.
A falta de uma avaliação prévia detalhada sobre a solução de problemas não-diretamente ligados com a engenharia (por exemplo o desmatamento) já resultou em grandes perdas econômicas para a região e em problemas adicionais para os reservatórios. No futuro, esta falta pode provocar outros problemas ecológicos e socioeconômicos, cujas soluções serão custosas, demoradas e politicamente difíceis. O enorme potencial hidrelétrico da bacia amazônica e o entusiasmo justificado sobre a impressionante capacidade tecnológica nacional não deveriam resultar numa aceitação total e indiscriminada de todos os conceitos tecnocráticos e na construção precipitada de qualquer reservatório tecnicamente viável. Em muitos casos, os custos ecológicos e, a longo prazo, também os custos econômicos não são adequadamente correlacionados com os benefícios.


USINA DE BELO MONTE E A QUESTÃO AMBIENTAL

O Xingu é um rio interior amazônico, que nasce a oeste da Serra do Roncador e ao norte da Serra Azul, no leste do Mato Grosso. Corre na direção sul-norte, paralelo aos rios Tapajós e Tocantins, e após percorrer pouco mais de 2 mil quilômetros, desagua ao sul da Ilha de Gurupá (PA), na margem direita do Amazonas, do qual é um dos maiores afluentes.


Cachoeiras da Volta Grande do Rio Xingu
Segundo os estudos elaborados pela Eletronorte entre 1975 e 1980, a Bacia Hidrográfica do Xingu, que se estende por 450 mil km2, tem um potencial hidrelétrico de 22 mil megawatts, um dos maiores do país. A Volta Grande do Xingu, uma queda de 96 metros onde o rio quadruplica de largura e forma diversas cachoeiras e ilhas, concentra boa parte do potencial hidrelétrico do rio sendo por isso o local escolhido para a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. “A Volta Grande do Xingu, local que é chamado de 'fall line' (linha de queda) sul-amazônica, nada mais é do que o ponto de encontro de um relevo cristalino, portanto, duro, com outro sedimentar, menos duro. Conforme a erosão do rio, o ponto mais rígido fica e o sedimentar cede. No passado, quando as cidades foram formadas, os viajantes, os jesuítas, vinham de barco e paravam nos pontos de cachoeira porque o barco não conseguia passar. Assim nasceram cidades como Tucuruí e Altamira.
De acordo com artigo dos antropólogos Eduardo Viveiros de Castro e Lúcia de Andrade, as perigosas cachoeiras do Xingu foram o grande obstáculo para a invasão européia na região, com a concentração de missões e vilas até o século XX no Baixo Xingu.
Indígenas e Terras Indígenas na Bacia do Xingu
- 28 etnias - 29 TIs(12 em Mato Grosso e 16 no Pará) - 19 800 000 ha de extensão das TIs - Cerca de 20 mil índios
Terras indígenas e população diretamente afetadas
- Duas TIs diretamente afetadas pela diminuição da vazão do rio: Paquiçamba e Arara da Volta Grande - Área Indígena Juruna do km 17 da PA-415 será afetada pelo aumento do tráfego na estrada - População total das três áreas = 226 pessoas (Fonte: Rima/Eletrobrás)
Terras indígenas e população indiretamente afetadas
- TI Trincheira do Bacajá - 673 pessoas - TI Koatinemo - 144 pessoas - Arara - 236 pessoas - Kararaô - 39 pessoas - Cachoeira Seca - 81 pessoas - Araweté - 398 pessoas - Apyterewa - 411 pessoas Total = 1982 pessoas (Fonte: Rima/Eletrobrás)
População total direta e indiretamente afetada
- 317.472 habitantes dos municípios de Altamira, Senador José Porfírio, Porto de Moz, Anapu, Vitória do Xigu, Medicilância, Gurupá, Brasil Novo, Placas, Uruará e Pacajá - 350 famílias de ribeirinhos que vivem nas Resex do Rio Iriri, Riozinnho do Anfrísio, Verde para Sempre e Médio Xingu - 21 comunidades quilombolas (Fonte: Rima/Eletrobrás)
Taxa de desmatamento nos municípios direta e indiretamente afetados (2008)

Extensão (km2) Desmatamento (km2) percentual (%)
Vitória do Xingu - 2 969 1 728 58,22
Altamira - 159 701 6 113,8 3,33
Sen.José Porfírio - 14 388 631,5 3,87
Anapu - 11 909 1 891,1 15,88
Brasil Novo - 6 370 2 411,5 37,86
Gurupá - 8 550 89,3 1,04
Medicilândia - 8 271 1 798,6 21,75
Pacajá - 11 852 4 565,2 38,52
Placas - 7 174 1 597,6 22,27
Porto de Moz - 17 429 773,1 4,44
Uruará - 10 704 2 788,1 25,83
(Fonte: Inpe/Prodes)
Atividades econômicas e atores locais
Geoprocessamento/ ISA Altamira, Anapu, Brasil Novo, Gurupá, Medicilândia, Pacajá, Placas, Porto de Moz, Senador José Porfírio, Uruará e Vitória do Xingu foram os municípios definidos pela Eletronorte como a área de abrangência de Belo Monte, locais que contam com Floresta de Terra Firme e Floresta de Várzea. Mais de 300 mil pessoas vivem na região, que tem como elemento integrador a Transamazônica e o Xingu em sua parte navegável e Altamira como maior centro urbano local, com mais de 70 mil habitantes.
As cidades da 'fall line' estão interligadas pela Transamazônica, que fez parte de um programa geopolítico, que envolvia, entre outros, a construção de diversas hidrelétricas na Amazônia para a expansão de projetos de mineração e industrialização do país e a colonização da região", diz Costa. Porém, em função de um período de incerteza econômica e instabilidade da moeda estrangeira, Tucuruí só foi construída a duras penas. Os projetos de colonização do governo foram conduzidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) a partir da década de 70 e contaram, principalmente, com migrantes do Nordeste e do Sul do país, que se estabeleceram em pequenas e médias propriedades.
Segundo Sônia Magalhães, pesquisadora do Departamento de Ciências Humanas do Museu Goeldi (PA), existem dois tipos de povoamento na área de influência de Belo Monte: o mais antigo, representado por populações ribeirinhas típicas da Amazônia, de origem indígena ou não, com uma menor relação com o mercado; e o mais recente, que se inicia com a colonização do Estado, notadamente pessoas da Bahia e da Região Sul, pequenos e médios agropecuaristas. “O campesinato mais consolidado, hoje formado por pequenos e médios agricultores, vem obtendo conquistas importantes relacionadas a políticas de crédito e ações de infra-estrutura.” Uma das principais organizações locais de trabalhadores rurais, a Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetagri) do Pará - filiada à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) - obteve há pouco tempo, por exemplo, a abertura de uma linha de crédito específica para a agricultura familiar, com recursos do Fundo Constitucional do Norte. Segundo dirigentes da Fetagri, esta linha de crédito possibilitou a permanência de mais de 700 famílias na região.
Cacau, café, maracujá, pimenta, castanha, arroz e feijão estão entre os principais produtos agrícolas locais. Existem também algumas fazendas de gado e, por outro lado, diversas populações ribeirinhas e comunidades indígenas que se sustentam, basicamente, da pesca”, afirma Reinaldo Correa Costa.
Geoprocessamento/ ISAJuruna, Assurini do Xingu, Araweté, Parakanã, Kararaô, Xikrin do Bacajá, Arara, Xipaia e Kuruaia são os povos indígenas que habitam a área de influêrncia direta e indireta de Belo Monte, conforme apontado acima, e que somam mais de 2 200 habitantes. A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) acrescenta a esta lista vários povos Kaiapó e cerca de 1.130 índios que habitam a zona urbana de Altamira (clique no mapa ao lado).
Além da agropecuária e da pesca, a extração de madeira também é uma fonte de renda local, complementa Maria do Socorro Simões, coordenadora do projeto Imaginário nas Formas Narrativas Orais Populares da Amazônia (IFNOIP), da Universidade Federal do Pará (UFPA).
A extração predatória de madeira ocorre principalmente nos municípios de Altamira, Senador José Porfírio, Brasil Novo, Uruará e Senador José Porfírio. De acordo com o diagnóstico do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) sobre a atuação do setor madeireiro no Estado entre 1998 e 2001 divulgado no início de outubro, o Pará responde pela produção de 65% da madeira em tora do Brasil. O engenheiro florestal Adalberto Veríssimo, um dos responsáveis pelo estudo, explica que a atividade madeireira atualmente não é significativa na área de influência de Belo Monte. Apesar disso, o diagnóstico aponta que está havendo uma migração de madeireiras para o Oeste do Estado e, em menor proporção, para pólos madeireiros de Altamira e Uruará.



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