O avanço das queimadas é um dos principais problemas ambientais na Amazônia |
A maior parte da Amazônia é a área de clima
equatorial, originalmente coberta pela floresta amazônica, que cobre cerca de
40% do território brasileiro, se estendendo pela região Norte, norte do
Centro-Oeste e o oeste do Maranhão, configurando a Amazônia Legal, área
de atuação da SUDAM.
A - Aspectos Naturais
A maior parte da região amazônica possui clima
equatorial, marcado pelas altas temperaturas o ano inteiro, tendo portanto,
pequena amplitude térmica anual. A pluviosidade é imensa, geralmente ultrapassando
2500mm anuais, sem existência de estação seca no noroeste da região - área de
origem da mEc, ou com uma estação seca muito curta.
O domínio climático determina a floresta mais
exuberante do planeta, a Floresta Equatorial ou Latifoliada, com grande
biodiversidade e enorme massa vegetal, determinando a sobreposição de vários
"andares" de floresta, dando-lhe a característica fechada. A floresta
Amazônica pode ser dividida em:
- Mata do Igapó - área próxima aos rios, estando permanentemente alagada.
- Várzea - nos trechos intermediários, possui vegetais de maior porte, como a seringueira (hevea brasiliensis), é inundada nas cheias.
- Mata de Terra Firma - nas áreas mais distantes dos rios, com árvores muito grandes e enorme riqueza na fauna.
O desmatamento da Floresta Amazônica se
intensificou a partir da década de 60 com a implantação do Programa de
Integração Nacional, envolvendo a construção de eixos viários, já que as
rodovias configuraram a infra-estrutura básica para os projetos de colonização.
A partir daí, há a expansão da fronteira agrícola, incrivelmente com avanço da
pecuária extensiva, além dos grandes projetos minerais e da ação das
madeireiras nacionais, que na década de 90 passam a ter a companhia das temíveis
madeireiras asiáticas.
O avanço das queimadas na Amazônia
1968 - Há duas décadas, os 5,1 milhões de km2
da Amazônia estavam praticamente intactos. Havia áreas desmatadas ao redor das
cidades de Belém e Cuiabá e nas regiões sul do Mato Grosso e norte de Goiás
(hoje Tocantins).
1978 - O governo decide colonizar Rondônia. As
queimadas avançam para oeste ao longo da rodovia BR-364, entre Cuiabá e Porto
Velho. Começam os projetos agropecuários no sul do Pará e sudeste do Maranhão.
1988 - A devastação já atinge mais de meio milhão
de km2. As queimadas consumiram grande parte do Mato Grosso,
Rondônia e Pará, quase todo o estado de Goiás (atual Tocantins) e Acre e
Roraima.
A intensificação do desmatamento vem provocando
prejuízos irreparáveis ao meio ambiente devido ao rompimento do equilíbrio
ecológico, já que a retirada da floresta determina:
- Alterações climáticas, devido ao aumento da quantidade de carbono na atmosfera e consequentemente da temperatura e a redução da Evapotranspiração que altera os índices pluviométricos.
- Alterações no equilíbrio térmico, já que o desmatamento altera a umidade.
- Desgaste do solo, devido a intensificação da lixiviação e a não reposição do material orgânico.
- Falta de regulação para a rede hidrográfica.
- Problemas para a fauna e retirada da flora nativa para pesquisas.
Outra característica marcante do quadro natural
amazônico é a rede hidrográfica, sendo a Bacia Amazônica a maior do mundo em
volume de água e, provavelmente, o rio Amazonas, o mais extenso do planeta.
Como o rio principal localiza-se sobre uma planície, constitui uma hidrovia de
milhares de quilômetros de extensão e devido a topografia da região, já que, os
seus afluentes vem de áreas mais altas, a área possui o maior potencial
hidrelétrico do país, o aproveitamento porém ainda é baixo, sendo este um
entrave para o desenvolvimento.
B - Aspectos Humanos
A região amazônica possui uma população absoluta
muito reduzida, o que aliado a sua grande extensão, determina baixíssimas
densidades demográficas. No entanto, nas últimas décadas a região vem tendo,
devido as migrações, o maior crescimento populacional do país, tendo sido, na
década de 80, de 4,5% ao ano contra a média nacional de l,8%.
Este grande crescimento populacional é fruto em
grande parte de migrações rural-rural (expansão da fronteira agrícola), que no
entanto, não impedem a região de ser predominantemente urbana, com cerca de 55%
da população vivendo em cidades. Esta aparente contradição pode ser explicada
pela enorme concentração fundiária e os constantes conflitos pela posse da
terra, envolvendo posseiros, grileiros, latifundiários e seus jagunços,
comunidades indígenas e populações extrativistas (seringueiros e castanheiros).
O principal aglomerado urbano é Belém, que é a
Metrópole Regional, seguida da cidade de Manaus, que vem sendo classificada de
metrópole em formação ou metrópole incompleta. Outras áreas de crescimento são
Rondônia, o sul do Pará e Tocantins.
C - Aspectos Econômicos
A pecuária extensiva é uma atividade marcante na
Amazônia, havendo grandes projetos ao longo das rodovias, que foram criados com
incentivos diretos e indiretos do governo federal, notadamente durante a
Ditadura Militar. A produtividade da pecuária na região é muito reduzida,
dificilmente alcançando 50 quilos anuais por hectare e declina rapidamente, em
virtude do enfraquecimento do solo (em algumas áreas da Europa a produtividade
alcança 600kg/há, além de haver produção leiteira). Como entender então a
existência dessa atividade?
Na verdade a pecuária extensiva é utilizada na
especulação fundiária, como forma de valorização e obstáculo para a
desapropriação para fins de reforma agrária.
A Ditadura Militar, citada anteriormente, é vital
para a compreensão do quadro econômico amazônico, já que, a construção das
"rodovias de penetração", iniciadas com a Transamazônica, e com o
desenvolvimento da Cuiabá-Santarém, Cuiabá-Porto Velho e a Porto Velho-Manaus.
Apesar da enorme riqueza potencial da
biodiversidade amazônica, que constitui o maior "banco genético
mundial", há pequena utilização por parte do Brasil para pesquisas e
desenvolvimento tecnológico (para alegria estrangeira que utiliza inclusive a
"biopirataria" na área).
O extrativismo mineral merece destaque, com
expressivo crescimento nas últimas décadas, principalmente com o Projeto
Carajás, no sul do Pará, controlado pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), que
envolveu enormes investimentos federais, incluindo uma hidrelétrica - Tucuruí
no rio Tocantins, e uma ferrovia de 640 km - Estrada de Ferro Carajás. Além
disso, temos a bauxita, no Pará, manganês no Amapá, ouro em várias regiões e
"terras raras" na região de Roraima.
Observação: SIVAM - Sistema de Vigilância da
Amazônia, monitoração via satélite, envolvendo radares fixos, móveis,
sensoriamento remoto e controle de tráfego aéreo; este projeto complementa as
ambições brasileiras da área do norte da América do Sul. Faziam parte do
projeto de ocupação, visando o "desenvolvimento e a segurança
nacional". Neste mesmo contexto da concessão de incentivos para a criação
da Zona Franca de Manaus (a preocupação com a região continua sendo um assunto
vital em termos de segurança, o que pode ser comprovado pelos recentes projetos
SIVAM e CALHA NORTE (quartel ao longo do rio Amazonas).
IMPACTOS
AMBIENTAIS DECORRENTES DA IMPLANTAÇÃO DE HIDRELÉTRICAS
A bacia hidrográfica do rio Amazonas, incluindo a
bacia do rio Tocantins/Araguaia, cobre uma área de 7,1 x 106km2.
A descarga média anual do rio Amazonas de 175 mil m³/sec e do Rio
Tocantins/Araguaia de 11 mil m³/sec representam um potencial hidrelétrico que,
até hoje, é pouco aproveitado (figura 1). No futuro, porém, esta energia será
utilizada tanto para os projetos de desenvolvimento da Amazônia quanto para o
abastecimento do Leste e do Sul do Brasil (STERNBERG, 1985a,b).
A avaliação do potencial hidrelétrico da bacia
amazônica encontra-se atualmente ainda em estado preliminar. Para os afluentes
do rio Amazonas, exceto o rio Tocantins/Araguaia, estima-se um potencial de
73,380 MW. Isso corresponde a 45% do potencial hidrelétrico de todo Brasil (figura 2). A Eletronorte (1985) menciona que 63
represas seriam necessárias para utilizar este potencial. Para a grande maioria
das represas ainda faltam dados técnicos específicos. O planejamento para o uso
da energia hidrelétrica do rio Tocantins/Araguaia encontra-se mais adiantado.
Vinte e sete represas estão previstas para o aproveitamento do potencial
hidrelétrico de 25.300 MW, correspondendo a 15% do potencial total do país (figura 3). Como estimativa geral, pode-se supor
um potencial total da Amazônia em termos de 100 mil MW. Por causa do relevo
pouco acidentado da região, uma área total de cerca de 100 mil km2
seria inundada em caso do aproveitamento total deste potencial.
Em 1980, na Amazônia, somente duas pequenas
represas hidrelétricas estavam em funcionamento: Curuá-Una, perto de Santarém,
e Paredão, no Amapá, no norte de Belém. Ambas cobrem uma área de menos de 100
km2 e têm uma capacidade de geração de 70 MW. Os impactos econômicos
e ambientais são pequenos. A situação mudou com a construção de Tucuruí no
baixo Tocantins, com uma área de 2.430 km2 e uma capacidade de
geração de 8 mil MW. Nos próximos anos, outras represas gigantescas serão
construídas na Amazônia brasileira, estando algumas já em fase adiantada de
construção, tais como Balbina, perto de Manaus, e Samuel, perto de Porto Velho.
Sem dúvida nenhuma, todas estas represas trarão fortes impactos ao meio
ambiente, por causa de seu tamanho.
Represas em outras regiões tropicais, por exemplo,
na África, mostraram um grande número de problemas laterais negativos, os
quais, na fase de planejamento, não foram previstos. Estas experiências são
altamente valiosas para a Amazônia, porém, não são diretamente transferíveis,
devido às diferenças fundamentais em relação às seguintes condições ecológicas
gerais:
a) A maioria das represas africanas foi construída
em regiões de deserto ou de savana com pouca vegetação. As represas amazônicas
cobrirão áreas de densa floresta tropical.
b) As condições hidroquímicas dos rios africanos
são bem diferentes das condições dos rios amazônicos, os quais são na sua
maioria mais ácidos, contêm menor quantidade de sais minerais dissolvidos e têm
uma composição iônica diferente.
c) A biota de ambos os continentes é diferente.
Conseqüentemente, as reações de plantas e animais às mudanças ambientais,
provocadas pela construção das represas, podem ser diferentes.
Por isso, as informações ecológicas existentes na
própria bacia amazônica como nas áreas adjacentes têm que ser levadas em
consideração prioritariamente. Estas informações, porém, são escassas, cobrindo
somente alguns aspectos durante períodos curtos. Conseqüentemente, uma
avaliação final sobre os impactos ecológicos das represas hidrelétricas
amazônicas será possível somente após alguns anos, ou até décadas, sendo o
presente trabalho sujeito a uma série de estimativas e especulações.
2. Translocação da população
Os multíplices problemas relacionados à
translocação da população são tratados em uma contribuição específica neste
volume.
3. Perda de solos
Por causa do relevo pouco acidentado da região
amazônica, as represas a serem construídas, na sua maioria, cobrirão áreas de
centenas até milhares de quilômetros quadrados com poucos metros de água. Os
solos variam consideravelmente em textura e mineralogia de acordo com as
condições geológicas locais. Na sua maioria, porém, eles podem ser considerados
como ácidos, pobres em sais minerais solúveis e de baixa fertilidade.
As perdas de solos têm que ser correlacionadas com
a produção de energia hidrelétrica. Neste respeito, existem grandes diferenças entre
as represas do mundo inteiro. Uma relação muito favorável entre a área alagada
e energia produzida é mostrada por Itaipu com 9 MW/km2; Tucuruí
produzira 3,3 MW/km2, Balbina somente 0,1 MW/km2. Em
outras represas tropicais, a variação é da mesma ordem, mostrando algumas
represas muito grandes da África, como, por exemplo, o lago Volta no rio Volta
(Ghana) e o lago Karíba, no rio Zambesi (Zimbabwe/Zambia), valores tão baixos
como os de Balbina.
A questão da perda de minerais tem que ficar até
certo ponto em aberto. Em algumas áreas, diamantes (por exemplo Tucuruí) e ouro
(por exemplo Balbina) foram descobertos. A quantidade total parece ser baixa.
Considerando, porém, o baixo nível de conhecimento sobre a geologia e
mineralogía da região, restam, pelo menos, dúvidas em termos de possíveis
perdas de valiosos recursos minerais por causa da inundação.
4. Perdas de espécies de plantas e animais
A maioria das áreas a serem inundadas é coberta por
densa floresta tropical, por exemplo, Balbina e Cachoeira da Porteira. Em
Tucuruí e Samuel, cerca da metade da área estava coberta por floresta
secundária, pastagens e pequenas parcelas cultivadas. A floresta tropical
sempre úmida é considerada o ecossistema mais rico em espécies no planeta,
sendo a maioria delas desconhecida pela ciência.
Amplos inventários botánicos e zoológicos foram
feitos em Tucuruí. Deve-se considerar, entretanto, que a área a ser levantada
era muito grande, a flora e a fauna demasiadamente diversificadas, o número de
especialistas envolvidos insuficiente e o tempo curto demais para chegar a um
nível satisfatório de conhecimento. Resta somente a esperança de que existam
áreas de distribuição suficientemente amplas fora de Tucuruí, para que seja
garantida a sobrevivência das espécies afetadas. Considerando a grande extensão
de Tucuruí e das outras represas, perdas de espécies sao prováveis, porém não
podem ser comprovadas definitivamente por falta de informações mais detalhadas.
Durante o represamento, a Eletronorte fez grande
esforço para salvar os animais atingidos pelas águas (operação Curupira).
Porem, resta em aberto a questão a respeito do valor de tal ação. Sem dúvida
nenhuma, populações pequenas, restritas a áreas limitadas, podem ser salvas,
quando existirem habitats adequados e livres à disposição, para onde os
animais possam ser transferidos. Em geral, porém, o represamento resulta na
transferência ou na migração de animais para áreas já ocupadas, provocando uma
superpopulação temporária e um stress para o sistema inteiro. No melhor dos casos,
isso pode resultar num aumento das populações anteriormente reduzidas por
caçadores. Estas populações, porém, serão reduzidas rapidamente nos anos
seguintes, se não se exercer um controle rígido dos caçadores e uma proteção
dos habitats naturais ao redor das represas. No pior dos casos, o acesso
fácil para áreas anteriormente inacessíveis e não-colonizadas nas beiras das
represas acelerará a exploração indiscriminada de recursos naturais. A
destruição da floresta aumentará se não tiver uma legislação protetora e
reguladora rigorosamente observada. Tais providências não foram tomadas até
agora de uma maneira adequada. Atualmente não existem programas de resgate para
outros reservatórios em construção.
Algumas represas e linhas de transmissão afetam
direta ou indiretamente reservas biológicas e indígenas, ou áreas que são
consideradas de valor a serem preservadas, como mostra Goodland (1978) para
Tucuruí. Obviamente a preocupação em relação a estes impactos é limitada.
A formação de lagos artificiais permanentes,
grandes e fundos, numa área onde tais habitats não ocorrem naturalmente,
pode ser considerada um aumento de nichos ecológicos para a flora e fauna
aquática. Observações no reservatório de Brokopondo, porém, não apóiam esta
consideração. Mesmo 20 anos depois do represámento, o reservatório é
relativamente pobre em plantas e animais e sem maior beleza. Os habitats artificiais
novos, obviamente, não compensam a perda dos habitats naturais
(LEENTVAAR, 1984).
5. Perdas de monumentos naturais e históricos
Nas áreas das represas atualmente em construção não
existem monumentos naturais considerados sem par ou de beleza excepcional.
Monumentos históricos espetaculares, tais como aqueles que foram ameaçados pela
construção da represa de Aswan no rio Nilo, não existem na área por causa de
sua história cultural. Porém, existem muitos pequenos lugares de importância
arqueológica na área toda, especialmente ao longo dos cursos dos rios, que
serão perdidos por causa da falta de conhecimento sobre a sua localização e o
difícil acesso à área.
6. Perda de recursos madeireiros
A quantidade de madeira de Valor comercial na
floresta natural é estimada entre 40 e 60 m³/ha. Mostra-se, porém, que os
problemas técnicos, infra-estruturais, organizacionais e de mercado internacional,
que resultam do tamanho enorme da área e da diversidade grande das espécies
madeireiras, eram até hoje grandes demais para serem resolvidos de uma maneira
adequada. A agência governamental Capemi, responsável pelo desmatamento de
Tucuruí, desistiu do empreendimento com grandes perdas. Para a área de Balbina
ainda não se conhecem empresas interessadas. O tempo disponível já é
insuficiente para um desmatamento adequado. Atualmente, uma parte da madeira de
Balbina é usada para produzir a energia termelétrica necessária para a
construção da represa. É planejada a implantação de mais duas termelétricas na
base de lenha picada, de 25 MW cada uma.
Mesmo construindo somente algumas das represas
planejadas, alguns mil quilômetros quadrados da floresta amazônica serão
inundados no futuro próximo. A utilização destes recursos madeireiros pode ser
considerada um dos grandes desafios técnicos e econômicos da região amazônica.
7. Modificações da geometria hidráulica do rio
Todos os rios tendem a atingir um equilíbrio
dinâmico entre a sua descarga, velocidade média, carga sedimentar e a
morfología de seu leito. A combinação destes fatores constitui a geometria
hidráulica do rio (LEOPOLD e MADDOCK, 1953). Plantas e animais aquáticos são
adaptados a estas condições específicas. O represamento de um rio significa uma
interrupção de um sistema aberto e de transporte por um sistema mais fechado e
de acumulação. Conseqüentemente, a construção de uma represa representa um
impacto fundamental para a geometria hidráulica de um rio, resultando em fortes
modificações hidrológicas, hidroquímicas e hidrobiológicas, que não somente
afetam a área do próprio reservatório, mas também a área abaixo da represa e,
no caso da biota, até a área acima dela.
7.1. Modificações na hidrologia
A finalidade da construção de uma represa
hidrelétrica é a de aproveitar água de alto desnível em quantidade constante
durante o ano todo. A represa nivela as flutuações naturais da descarga do rio.
Conseqüentemente, as flutuações do nível do rio abaixo da represa são
modificadas. Rios com alta descarga, por exemplo o rio Tocantins, são
influenciados de tal modo que níveis extremamente baixos e, até certo ponto,
extremamente altos são evitados. O tempo de retenção, ou seja, o tempo teórico
de troca do volume total da água de Tucuruí é durante a enchente somente de 2-3
semanas. Conseqüentemente, o padrão natural do ciclo hidrológico abaixo da
represa será mantido com uma amplitude reduzida, porque a descarga do rio
Tocantins durante a cheia é grande demais para ser estocada na represa. Rios
com descarga pequena, por exemplo o rio Uatumã, vão perder seu padrão natural
de descarga abaixo da represa, porque a capacidade de estocagem do reservatório
é suficientemente grande para controlar a descarga completamente.
A eliminação das inundações no rio Nilo em
conseqüência da construção da barragem de Aswan resultou na queda de
fertilidade e no aumento da salinidade dos solos abaixo da barragem (RZOSKA,
1976). Tais problemas são de baixa importância para a maioria dos rios
amazônicos selecionados para a produção de energia hidrelétrica. Estes
pertencem aos tipos de rios de água clara e de água preta que possuem áreas
alagáveis de baixa fertilidade natural e baixo potencial agrícola. Um aumento
da salinidade dos solos não ocorrerá por causa das baixas concentrações de sais
minerais nos solos e na água e por causa da alta precipitação anual.
7.2. Modificações da carga sedimentar
A redução da correnteza resulta na deposição dos
sedimentos dentro dos reservatórios. A carga sedimentar relativamente baixa de
rios de água clara e água preta garante aos reservatórios hidrelétricos
amazônicos teoricamente uma vida útil de centenas de anos. Porém, deve-se
salientar que estes tipos de rios são pobres em sedimentos por causa de uma
floresta densa e quase contínua, que cobre as bacias hidrográficas e protege os
solos contra a força erosiva de cerca de 2 mil mm/a de chuva. Exatamente esta
proteção será eliminada em grande escala, por causa dos grandes projetos de
mineração, industriais e agropecuários a serem implantados em conseqüência da
disponibilidade da energia hidrelétrica. Por isso, a erosão pode aumentar
facilmente de 10 a 100 vezes, como foi mostrado em estudos realizados nos EUA
(WARK e KELLER, 1963; WOLMAN, 1964; WAHRHAFTIG e CURRY, 1967). Sem medidas
rígidas e amplas para um controle da erosão em toda a bacia hidrográfica, a
vida útil real das represas poderá reduzir-se drasticamente.
A erosão lateral dos reservatórios pode acelerar
mais o seu aterro se não existir vegetação protetora nas margens. Os
reservatórios amazônicos são bastante rasos. Flutuações do nível da água de
poucos metros resultarão em inundação ou seca de centenas de quilômetros
quadrados. A diferença de 4 m entre a quota 46 m e a quota máxima de 50 m de Balbina
afeta cerca de 800 km2 de floresta. Existem na Amazônia muitas
espécies arbóreas resistentes a inundações periódicas. O processo de
colonização, porém, é demorado e necessitara décadas se não for acelerado pelo
homem. Experimentos de germinação estão sendo financiados pela Eletronorte.
Porém, não se pode dizer até que ponto as espécies podem tolerar o ciclo
hídrico artificial dos reservatórios.
A deposição dos sedimentos dentro dos reservatórios
não somente reduz a sua vida útil, mas aumenta também a erosão no vale abaixo
das represas, até chegar de novo ao equilíbrio determinado pela geometria
hidráulica do rio. Este efeito pode até afetar o delta dos rios como ocorreu no
rio Nilo. Quando o transporte de água e de sedimentos através do rio Nilo para o
Mediterrâneo foi interrompido, devido à construção da represa de Aswan, começou
logo a erosão do delta pelo mar.
Os rios da Amazônia selecionados para a construção
de represas hidrelétricas têm, na sua maioria, uma carga sedimentar
relativamente baixa e, com ela, faixas aluvionais (várzeas ou vargens)
pequenas. Por isso, a erosão das beiras de solos friáveis ocorrerá somente
em pequena escala. Uma exceção pode ser o rio Madeira, rio de água branca, rico
em sedimentos. A sua várzea no curso inferior, bastante estreita, pode ser
sujeita a fortes modificações por erosão em caso da construção de uma barragem.
7.3. Mudanças florísticas e faunísticas abaixo e
acima da represa
Mudanças no regime hídrico influenciam fortemente a
flora e a fauna adaptada a determinadas flutuações do nível e da correnteza.
Nos trópicos, até agora, existem poucas informações sobre mudanças florísticas
abaixo de represas, porque comunidades naturais foram pouco utilizadas pelo
homem e, conseqüentemente, pouco estudadas. Levando em conta as experiências de
regiões temperadas, supomos que as espécies resistentes contra inundações
periódicas serão substituídas por espécies de áreas não-inundáveis. Plantas
herbáceas vão reagir muito mais rapidamente do que árvores por causa de seu
ciclo de vida mais curto.
Como exemplo do impacto negativo do controle da
descarga para a fauna abaixo do reservatório podem servir as grandes
tartarugas. Elas desovam nas praias (tabuleiros) durante a seca. Os tabuleiros
mais importantes no baixo rio Amazonas encontram-se no baixo rio Trombetas,
abaixo da represa Cachoeira da Porteira, atualmente em planejamento. Há alguns
anos, estes tabuleiros são estritamente protegidos pelo IBDF (Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal) e têm o status de uma reserva
biológica. Supõe-se que, pela mudança do regime hidrológico, os tabuleiros
serão afetados de uma tal maneira que a população das tartarugas será
drasticamente reduzida, pondo em risco a finalidade principal de uma das poucas
reservas biológicas amazônicas bem estabelecidas e bem protegidas.
Mudanças hidrológicas e florísticas dentro das
áreas alagáveis têm impactos grandes para as redes alimentícias, tanto no rio
quanto nas áreas de terra firme adjacentes e podem resultar em modificações
grandes na biocenose. Nas savanas da África, os animais de caça invadem durante
a seca as áreas alagáveis dos rios, por exemplo do rio Kafue, na Zâmbia (WERGER
e ELLENBROEK, 1980), para comer os capins aquáticos e palustres de alto valor nutritivo.
No caso do controle das inundações por uma represa, os capins resistentes a
inundações iriam ser substituídos por capins de savana com baixo valor
nutritivo durante a seca. Em conseqüência, a oferta de alimento seria reduzida
fortemente na fase mais critica, diminuindo desta forma a capacidade de
sustentação (currying capacity) do sistema inteiro.
Na Amazônia, a migração de animais de caça da terra
firme para as várzeas e igapós é pouco desenvolvida por causa do número menor
de espécies. Porém, existem migrações laterais de numerosas espécies aquáticas,
por exemplo peixes, tartarugas, jacarés, peixes-boi, etc., entre os rios e as
áreas alagáveis. A capacidade de sustentação do sistema rio/várzea ou igapó,
respectivamente, depende da fertilidade da água e dos solos e do tamanho da
área alagada (WELCOMME, 1979). A produção íctica/ha em áreas alagáveis grandes
é maior de que em áreas alagáveis pequenas de fertilidade igual. Pode-se, por
isso, supor que a redução da área alagável abaixo da represa em conseqüência da
mudança do regime hídrico não somente modificará a composição da flora e fauna
em termos de espécies, mas também diminuirá a produtividade do sistema inteiro.
A ictiofauna será modificada abaixo da represa,
dentro da mesma e acima dela. A grande maioria das espécies ícticas de valor
para o consumo humano são espécies migratórias (espécies de piracema). Elas
realizam grandes migrações durante as quais o desenvolvimento gonadal na sua
fase final é estimulado. Além das migrações de desova, elas fazem migrações
tróficas rio acima, pelas quais o transporte dos ovos e das larvas rio abaixo é
compensado. Para elas, as barragens representam um obstáculo insuperável. Como
foi mostrado em Curuá-Una e Tucuruí, as populações de muitas espécies migratórias
serão fortemente reduzidas ou extintas no reservatório e até acima dele
(VIEIRA, 1982; HOLANDA, 1982; FERREIRA, 1984 a).
Muitas destas espécies são detritívoras ou
parcialmente herbívoras. Ambos os itens alimentares encontram-se em grandes
quantidades nos reservatórios, mas provavelmente não serão utilizados
adequadamente por falta de um número suficiente de espécies e espécimes
adaptados. Estudos em Curuá-Una mostram que, alguns anos depois do
represamento, nenhuma das espécies que ocorrem na represa foi capaz de aumentar
a sua população de um modo tal que substituísse as espécies previamente
eliminadas (FERREIRA, 1984 b).
O problema poderia ser resolvido em parte pela
construção de escadas de peixes. Tais escadas existem no Brasil até hoje
somente em número pequeno. Godoy (1985) menciona 35 escadas, sendo a maioria
delas de tamanho pequeno, ultrapassando somente uma diferença de menos de 10 m
de altura. Uma escada de peixes de maior porte (20 m) está atualmente em
construção no rio Paraná (ilha Grande). A Eletronorte não planeja a construção
de escadas de peixes nas barragens da Amazônia.
7.4. Impactos para a pesca e a aqüicultura
Apesar da redução das áreas alagáveis em tamanho e
em fertilidade pela construção de uma represa, a produção íctica do sistema inteiro
pode ser mantida, como no rio Nilo. A queda drástica da captura no curso
inferior e no delta foi compensada pela captura no próprio reservatório.
Compensações similares são estimadas para as represas Pa Mong, no rio Mekong, e
Kainji, no rio Niger (WELCOMME, 1979).
O problema de uma possível redução dos estoques de
peixes migratórios em rios amazônicos por causa das represas já foi mencionado.
Além disso, a produção pesqueira em represas grandes baseia-se freqüentemente
em espécies pelágicas. Em reservatórios africanos, por exemplo no lago Kariba,
a pesca no pelagial contribui atualmente com cerca de 90% da captura total
(GLIWICZ, Univ. Varsóvia, Polônia, com. pess.). Isso, porém, só foi possível
por causa da introdução de uma espécie pelágica, a sardinha do lago Tanganjika,
Limno-thrissa miodon. A questão da existência ou não de espécies
apropriadas na Amazônia fica em aberto. Além disso, a fertilidade dos rios
amazônicos de água preta e água clara é bem inferior àquela de rios africanos,
sendo a produção no pelagial bastante reduzida, como mostram estudos sobre a
densidade do zooplâncton em Curuá-Una (ROBERTSON, 1980).
A legislação brasileira exige das companhias
construtoras de represas a passagem livre de animais aquáticos em rios, seja
através da construção de escadas de peixes, seja através de um povoamento dos
reservatórios com alevinos de espécies ícticas de valor comercial. Como a
construção de escadas de peixes não está prevista pela Eletronorte, a produção
de alevinos nas estações de aquicultura terá importância crescente. Isso traria
um impacto positivo para o desenvolvimento da aquicultura de iniciativa privada
na Amazônia, que atualmente existe somente em forma rudimentar. O potencial da
pesca interior nas águas amazônicas ainda permite um aumento da captura
(BAYLEY, 1981), sendo os seus limites, porém, visíveis para o fim deste século.
Por isso, a aquicultura terá no futuro um papel cada vez mais importante na
Amazônia (JUNK, 1984). Até que ponto a construção e manutenção de estações de
aqüicultura será realizada pela Eletronorte fica ainda para ser determinado.
A pesca em reservatórios amazônicos pode sofrer um
problema adicional por uma infestação maciça de peixes com parasitas. Poucos
anos depois do represamento do rio Curuá-Una, os peixes (por exemplo Cichla
ocellaris) capturados no reservatório mostraram uma taxa tão alta de
infestação com nematódeos que a população local quase parou de pescar e comer
peixe (FERREIRA, com. pess.). Não se sabe ainda até que ponto isso foi um
problema local e temporário de Curuá-Una.
Considerando todas estas dúvidas, existem
atualmente somente estimativas da produção íctica dos reservatórios a serem
construídos e da importância socioeconómica das atividades pesqueiras
relacionadas. Em Sobradinho, no rio São Francisco, a captura média de 1979/1980
era de 35 kg/ha (PAIVA, 1982). Na Amazônia, a baixa fertilidade da água, os
problemas com a produção e estocagem de alevinos e a possível falta das
espécies pelágicas, porém, sugerem capturas menores. Baseando-se em dados
disponíveis sobre a produção primária e secundária de águas naturais
amazônicas, uma estimativa a longo prazo de 20-40 kg/ha/ano parece ser
realística depois de uma fase inicial de produção superior. Tucuruí deveria
produzir perto de 40 kg/ha, enquanto os valores de Balbina deverão ser menores.
Conseqüentemente, a contribuição dos reservatórios amazônicos ao abastecimento
da população com proteína será somente de importância local.
7.5. Crescimento maciço de macrófitas aquáticas
Um dos fenômenos biológicos mais alarmantes em
represas tropicais é o desenvolvimento em massa de macrófitas aquáticas. A
maioria das represas africanas e asiáticas foram afetadas, como também a
represa de Brokopondo no Suriname. Muitos problemas estão relacionados com o
desenvolvimento em massa de macrófitas aquáticas, por exemplo o aparecimento de
doenças (Schistosomíasis), a deterioração da qualidade da água pela grande
produção e a decomposição de matéria orgânica, o impedimento da pesca e do
tráfego, o entupimento de canais de irrigação, a interferência em plantações,
por exemplo de arroz, o aumento da evapotranspiração, o impedimento de
atividades turísticas, etc.
Vários fatores são necessários para permitir o
crescimento maciço de macrófitas aquáticas:
a) alta
capacidade reprodutiva das plantas,
b) alto nível de nutrientes,
c) condições climáticas favoráveis,
d) falta de espécies competidoras,
e) falta de animais herbívoros, pragas e doenças.
b) alto nível de nutrientes,
c) condições climáticas favoráveis,
d) falta de espécies competidoras,
e) falta de animais herbívoros, pragas e doenças.
Algumas das espécies mais daninhas em represas
africanas e asiáticas são endêmicas na América do Sul tropical, por exemplo Eichhornia
crassipes e Salvinia auriculata (Salvinia molesta, da represa
Kariba, foi descrita mais tarde como espécie nova com reprodução exclusivamente
vegetativa).
A alta capacidade reprodutiva de muitas plantas
aquáticas da Amazônia é explicada provavelmente pelo fato de que elas crescem
nas várzeas dos grandes rios sujeitos a altas flutuações do nível da água.
Grandes perdas periódicas durante a seca favoreceram a seleção genética para
altas taxas de reprodução que foram conseguidas principalmente por reprodução
vegetativa. A condição principal para o aproveitamento máximo desta capacidade
é a disponibilidade de nutrientes. Nas águas brancas da Amazônia em condições
nutritivas favoráveis, Salvinia auriculata e Eichhornia crassipes mostram
um crescimento exponencial com um período de duplicação de 6-8 dias (JUNK e
HOWARD-WILLIAMS, 1984). Valores similares foram medidos em reservatórios
africanos (MITCHELL e TUR, 1975; BOND e ROBERTS, 1978). Nos lagos das áreas alagáveis
dos rios amazônicos de água clara, o crescimento das plantas é fortemente
reduzido por falta de nutrientes. Em rios e lagos de água preta, estas plantas
normalmente não ocorrem, por causa do baixo teor de nutrientes, provavelmente
em combinação com a alta acidez da água (BERG, 1961).
O represamento de um rio num reservatório novo
normalmente leva a um aumento considerável do teor de nutrientes por causa da
lixiviação do solo inundado e da decomposição da vegetação terrestre afogada.
Isto pode aumentar a concentração dos nutrientes até um ponto que acarreta o
crescimento maciço de macrófítas aquáticas, se existirem espécies adequadas
presentes, como demonstrado em Curuá-Una.
A área influenciada pelas águas do rio Curuá-Una
foi pesadamente infestada por Eichhornia crassipes, Scirpus cubensis, Pistia
stratiotes e, em quantidade inferior, por Paspalum repens. Animais
herbívoros, parasitas e doenças não foram capazes de controlar o crescimento, e
da competição somente resultou a substituição de uma planta daninha por outra.
Em 1979, as plantas cobriram 27% da superfície. As áreas diretamente
influenciadas pelas águas extremamente ácidas e pobres em nutrientes dos
afluentes Mojuí e Moju não foram colonizadas, apesar de uma infestação
permanente por plantas carregadas pelo vento (JUNK, 1982). Depois de 1979, o
crescimento reduziu-se por causa da diminuição de nutrientes, que resultou do
curto período de retenção da água no reservatório. Atualmente, somente pequenas
quantidades de macrófítas aquáticas estão presentes em Curuá-Una.
Um padrão similar de desenvolvimento foi registrado
em outras represas tropicais. No lago Kariba, durante o desenvolvimento máximo,
Salvinia molesta cobriu 22% da área, correspondendo a 1 mil km2
(MITCHELL & TUR, 1975). Atualmente, somente 3% da superfície estão cobertos
com tendência a diminuir ainda mais (KRONBERG, Univ. Lund, Suécia, com. pess.).
No reservatório de Brokopondo, Suriname, em condições hidroquímicas similares
às da Amazônia, houve um crescimento maciço de Eichhornia crassipes e Ceratopteris
pteridoides logo depois do represamento (DONSELAAR, 1968). Eichhornia, foi
eliminada com herbicidas (2,4,D). Ceratopteris sumiu ao mesmo tempo
(LEENTVAAR, 1973). De acordo com o nosso conhecimento atual, as plantas teriam
desaparecido de qualquer modo sem aplicação de herbicidas, devido à falta de
nutrientes. O fato de que as plantas não reaparece indica a continuação das
condições hidroquímicas desfavoráveis. O reservatório de Guri, na Venezuela,
não mostrou na primeira etapa de represamento qualquer problema com macrófitas
aquáticas. Um desenvolvimento maciço foi registrado logo depois da segunda
etapa, quando áreas grandes de floresta foram alagadas. Em Tucuruí, um
crescimento maciço de Salvinia auriculata começou logo depois do represamento
em 1985. Depois de alguns meses de crescimento, as plantas desapareceram e
começaram a reaparecer na época chuvosa em 1986.
Podemos resumir que, de acordo com o nosso
conhecimento atual, as represas amazônicas construídas em rios de água clara e
água preta podem ser afetadas por macrófitas aquáticas durante e logo depois do
represamento. Porém, depois de um período de alguns meses até poucos anos de
crescimento intensivo, dependendo da disponibilidade de nutrientes no
reservatório, o número das plantas diminuirá fortemente. As plantas podem
desaparecer completamente em reservatórios de água preta, ou ocupar pequenas
áreas protegidas contra o vento nos de água clara. Um crescimento mais forte
pode ocorrer perto dos afluentes por causa do melhor abastecimento com
nutrientes e em áreas poluídas onde as plantas podem localmente criar
problemas. Reservatórios construídos em rios de água branca, ricos em
nutrientes, por exemplo o rio Madeira, podem ser considerados altamente
problemáticos em termos do permanente crescimento maciço de macrófitas
aquáticas.
Qualquer discussão sobre o controle químico de
macrófitas aquáticas tem que levar em conta que operações contínuas serão
necessárias enquanto existirem nutrientes em quantidade suficiente à disposição
das plantas. Considerando o tamanho dos reservatórios e o crescimento rápido
das plantas, tais operações serão muito custosas, necessitando muita
mão-de-obra, e poderão, a longo prazo, intoxicar o ecossistema, inclusive o
homem.
7.6. Deterioração da qualidade da água
Águas paradas nos trópicos quentes mostram em geral
uma hipoxia forte ou até anoxia nas camadas profundas, apesar de uma termoclina
pouco pronunciada. Isto se deve ao fato de que a solubilidade de oxigênio na
água diminui com o aumento da temperatura, enquanto que os processos de
decomposição que consomem oxigênio se aceleram. Represas tropicais mostram este
padrão especialmente bem durante os primeiros anos depois do represamento,
porque têm à sua disposição, nas áreas recentemente inundadas, grandes
quantidades de matéria orgânica facilmente degradável. Dependendo do tipo de
vegetação, em áreas cobertas por savanas, a biomassa pode variar entre 10 e 100
t/ha de matéria seca, enquando na floresta amazônica o valor chega a 600 t/ha.
Uma parte considerável deste material, por exemplo folhas, plantas herbáceas e
capins decompõem-se em poucas semanas ou meses; madeira leve necessita alguns
anos, enquanto madeira dura e pesada podem resistir décadas até centenas de
anos debaixo da água.
Conseqüentemente, a demanda bioquímica de oxigênio
é muito alta durante e pouco depois do represamento, diminuindo nos anos
seguintes com a diminuição do material fácil a decompor-se. Os nutrientes
liberados em conseqüência da decomposição e lixiviados do solo inundado são usados
pelo fitoplâncton, perifíton e macrófitas aquáticas, que produzem de novo
material de fácil decomposição. Enquanto o fitoplâncton e perifíton liberam
oxigênio para dentro da água, as macrófitas aquáticas flutuantes e emergentes
contribuem somente com pouco ao mesmo, porque o oxigênio produzido é liberado
na sua maior parte para o ar. Além disso, macrófitas aquáticas flutuantes
reduzem as turbulências provocadas pelo vento, diminuindo o intercâmbio de
gases entre a água e o ar. Conseqüentemente, uma forte hipoxia e a formação de
gás sulfídrico nas camadas inferiores são freqüentes em represas tropicais. A
mortalidade de peixes que ocorre sempre no começo do represamento é devida à
falta de oxigênio para as espécies acostumadas a água corrente e bem oxigenada.
Cálculos preliminares em Curuá-Una mostram que a
maior parte do oxigênio entra no reservatório pelos afluentes.
Conseqüentemente, a extensão da camada anóxica e o tempo de existência dela são
fortemente influenciados pelo tempo de retenção da água no reservatório. Um
gradiente horizontal de oxigênio do afluente para o efluente é um fenômeno
freqüentemente encontrado em represas tropicais, como também mostrado no
reservatório de Brokopondo (VAN DER HEIDE, 1982). Medidas e cálculos para
Curuá-Una durante o terceiro ano após o represamento mostraram que, em períodos
de retenção de mais que 30 dias, o gás sulfídrico começou a aparecer no fundo,
perto da barragem (JUNK at al. 1981; DARWICH, 1982). Tucuruí mostrou
anoxia no fundo durante a estiagem. O oxigênio reapareceu durante a época
chuvosa devido ao alto fluxo da água, variando o período de retenção entre
poucas semanas na época chuvosa e alguns meses na época de estiagem. A
concentração de oxigênio em Tucuruí aumentará ainda consideravelmente nos próximos
anos com a diminuição da quantidade do material orgânico facilmente oxidável.
Reservatórios com prolongados períodos de retenção, tais como Balbina, sempre
sofrerão hipoxia nas camadas inferiores.
Além do impacto negativo para a biota, a má
qualidade da água afeta as turbinas e as construções, criando gastos elevados
de manutenção. Após poucos anos de funcionamento, peças das turbinas de
Curuá-Una tinham que ser substituídas por causa da corrosão. O sistema de
refrigeração foi bloqueado por causa de um desenvolvimento em massa de
bactérias, forçando a parada temporária das turbinas.
7.7. Problemas sanitários
Problemas sanitários em reservatórios são
normalmente relacionados com esgotos ou com parasitas, cujos hóspedes
intermediários pode estabelecer-se e proliferar com sucesso no novo meio
ambiente. Além disso, pode haver problemas com número.elevado de mosquitos (Cullex
spp.), ou com o mal cheiro de gás sulfídríco. Doenças intestinais,
provocadas pelo consumo de água poluída, são freqüentemente relacionadas com um
tratamento inadequado de esgotos. Ocasionalmente, o crescimento maciço de algas
cianofíceas e a decomposição de macrófitas em grande escala podem deteriorar a
qualidade da água e provocar problemas gastrointestinais, um aumento da malária
foi reportado em várias represas tropicais (BROWN e DEOM, 1973). Moléstia pelo
aumento de mosquitos foi observada em Curuá-Una.
Na Amazônia, uma das maiores preocupações
existentes diz respeito ao aparecimento da Schistosomíasis nas represas. Esta
doença, muito problemática, já atinge amplamente o Nordeste do Brasil e em
Minas Gerais. A condição básica para o estabelecimento da doença é a existência
de moluscos planorbídeos do gênero Biomphalaria nas represas. Eles não
ocorrem em águas ácidas e pobres em cálcio, típicas dos rios de água preta. Em
rios de água clara, menos ácidos e mais ricos em cálcio, eles podem existir. Em
rios com água branca, eles são muito freqüentes quando macrófitas aquáticas
oferecem boas condições para o seu desenvolvimento. Em Curuá-Una, uma espécie
de Biomphalaria foi encontrada em baixo número entre as macrófitas. O
rio Tocantins/Araguaia tem águas neutras e relativamente ricas em cálcio
(SANTOS, 1984). O rio é colonizado por muitos moluscos, tanto biválvios quanto
caramujos. Biomphalaria não foi encontrado até agora, porém existe
naquela bacia hidrográfica (GOODLAND, 1978). Não existem até agora relatórios
de casos autóctones de Schistosomíasis como conseqüência da construção das
represas. Porém, existem em Tucurui tanto as condições hidroquimicas para o
crescimento dos moluscos quanto as possibilidades de infestação com o parasita,
por causa do alto fluxo não-controlado da população.
8. O impacto ao balanço global de CO2
Meteorologistas, físicos e ecólogos, com crescente
preocupação, chamam a atenção para o perigo de uma mudança global do clima em
conseqüência do aumento de CO2 na atmosfera, por causa da queima de
combustíveis fósseis e da destruição das florestas tropicais em grande escala.
O cenário delineado a esse respeito é alarmante para a humanidade e pode
tornar-se realidade, já no próximo século, se a emissão de CO2 não
for reduzida consideravelmente. Por isso, uma avaliação do papel das represas
hidreléticas em relação ao balanço de CO2 é de grande importância.
A construção da represa de Tucuruí ocupa uma área
de 2.430 km2, sendo cerca da metade coberta com floresta. Estima-se
um valor médio de 300 t/ha de matéria orgânica seca para a área inteira. Isso
corresponde a 72,9 x 106 t de matéria orgânica e, respectivamente,
36,45 x 106 t de carbono para a área desta represa. Simplificando,
supõe-se que no decorrer do tempo todo este carbono seja transferido para a
atmosfera em forma de CO2. Uma quantidade equivalente de carbono é
emitida para a atmosfera quando se queima 45,6 x 106 t de óleo
diesel. Supondo 10.900 kcal/kg de óleo diesel e uma taxa de aproveitamento de
20% em forma de energia elétrica numa usina termoelétrica, a queima de 45,6 x
106 t de diesel produz 8 mil MW durante um período de cerca de 1,5
anos. Em relação ao balanço de CO2, a construção de Tucuruí
compensará tal produção já depois de 1,5 anos, se trabalhar com toda a
capacidade.
Esta estimativa tem falhas, porque não leva em
consideração a destruição acelerada da floresta em conseqüência da existência e
do funcionamento da usina, que pode ultrapassar consideravelmente a área da
própria represa. Além disso, supunha-se a utilização da capacidade total que,
na realidade, será efetivada somente em alguns anos. Considerando, por isso,
nos cálculos uma área adicional de floresta virgem cinco vezes maior do que a
da represa de Tucuruí, com 600 t/h de matéria orgânica e a utilização de 50% (=
4 mil MW) da capacidade total, o balanço de CO2 começa a ser
positivo cerca de 37 anos depois da construção. Considerando a vida útil do
reservatório, este valor indica um impacto positivo ao meio ambiente.
Fazendo os mesmos cálculos para Balbina (mesma área
de reservatório completamente coberta com floresta, capacidade total de 250
MW), o balanço de CO2 começa a ficar positivo para a área do
reservatório sem destruição adicional de floresta somente depois de 107 anos. A
instalação prevista de duas usinas termelétricas de 25 MW cada uma, usando
madeira picada dos arredores da represa, deteriora o resultado ainda mais. Por
isso, Balbina não pode ser considerada positiva em relação ao balanço de CO2.
9. Avaliação geral e recomendações
Em conseqüência de decisões políticas tomadas anos
atrás sobre os grandes projetos na bacia amazônica as possibilidades reais de
implantação desses projetos, respeitando as necessidades ecológicas, são
remotas. Este é um problema geral no mundo inteiro: engenheiros têm vários anos
e bastante dinheiro à disposição para realizarem estudos sobre as alternativas
técnicas, a fim de resolver um dado problema. Ecólogos, porém, são chamados
somente quando as decisões já foram tomadas sob aspectos técnicos, econômicos e
políticos. O ecólogo fica na situação incômoda de constatar os fatos
consumados, criticá-los e tentar reduzir dentro do possível os impactos negativos.
Conseqüentemente, as possibilidades para uma colaboração eficaz entre
engenheiros, políticos e ecólogos são bastante reduzidas.
Para evitar outras decisões duvidosas, torna-se
necessária uma rediscussão das prioridades em relação à construção de represas
e linhas de transmissão, através de engenheiros e especialistas de alto nível
de outras áreas ligadas ao problema.
Considerando os fatos e argumentos anteriormente
discutidos, a utilização de energia hidrelétrica para a realização dos projetos
de desenvolvimento na Amazônia pode ser recomendada, porém, com uma série de
restrições.
Deve-se enfatizar que muitos dos reservatórios
planejados vão provocar tantos impactos negativos ao meio ambiente que a sua
construção não é recomendável. Enquanto, por exemplo Tucuruí pode ser
considerada uma alternativa aceitável em comparação com outras soluções, para
satisfazer a demanda de energia elétrica (usinas termelétricas ou
termonucleares), a construção de Balbina tem que ser considerada um projeto que
não compensa os danos infligidos ao meio ambiente. Por causa da sua baixa
capacidade total, Balbina não vai satisfazer a demanda de energia elétrica de
Manaus e do seu pólo industrial, nem garantir o futuro desenvolvimento da
região.
A longo prazo, o abastecimento da Amazônia com
energia elétrica e o seu transporte para o Nordeste e Sul do país vai requerer
a construção de uma rede de linhas de transmissão, que em parte já foi
planejada pela Eletronorte. Manaus, por exemplo vai necessitar a longo prazo de
uma linha de transmissão, ou de Cachoeira da Porteira, ou de Tucuruí, ou de uma
outra represa de alta potência, além da construção de Balbina. Por isso, a
produção de energia hidrelétrica poderia ser concentrada em poucas bacias
hidrográficas bem apropriadas. A bacia dos rios Tocantins/Araguaia, por exemplo
já foi prevista para a construção de muitos reservatórios. Valeria a pena
avaliar a viabilidade econômica de dar-se prioridade para a construção dessas
represas e selecionar mais uma ou duas bacias apropriadas em outra parte da
Amazônia, distribuindo de lá a energia para os locais de consumo, em vez de
construir represas isoladas em todos os afluentes. Isto concentraria os
impactos ecológicos e reduziria o total dos efeitos negativos para o meio
ambiente. Além disso, a Eletronorte iria usufruir de uma série de vantagens de
tal política, tais como um aproveitamento melhor da água estocada, aumento do
tempo útil das represas por causa da melhor distribuição dos sedimentos, melhor
controle da inundação, melhoramento do tráfego naval e melhor controle da
imigração humana, controle da erosão e poluição em somente poucas bacias
hidrográficas, monitoramento de fatores hidrológicos, hidroquímicos e
hidrobiológicos em somente poucos rios, etc. Apesar das perdas de energia em
conseqüência do transporte sobre longas distâncias, a concentração da produção
de energia em poucas bacias apropriadas poderia ser uma alternativa
economicamente viável e ecologicamente recomendável em comparação com o
conceito atual.
Além disso, deve-se enfatizar que a construção de
represas hidrelétricas grandes não resolve o problema energético da Amazônia em
geral, mas somente aquele dos centros urbanos e industriais. Atualmente, existe
o perigo de que as fascinantes possibilidades tecnológicas de grandes projetos
industriais e de mineração se sobreponham às necessidades energéticas das áreas
rurais. O desenvolvimento de tecnologias funcionais, baratas e adequadas para o
abastecimento de pequenas comunidades rurais com energia elétrica (por exemplo
miniusinas hidrelétricas) e sua ampla distribuição é fundamental para o
melhoramento da infra-estrutura rural. Uma infra-estrutura adequada, porém, é
necessária para estabelecer a longo prazo uma agricultura efetiva e produtiva,
que é essencial para o abastecimento dos centros urbanos e industriais
existentes e em planejamento. Se isso não for possível, surge o grande risco de
uma migração acelerada da população rural para os centros urbanos e
industriais, onde altos preços para itens alimentares básicos, importados de
longas distâncias, e altas taxas de desemprego podem resultar em sérios
problemas socioeconómicos. A Amazônia iria escapar da crise energética,
freqüentemente citada, para passar diretamente à crise alimentícia e à crise de
empregos nos centros urbanos.
A falta de uma avaliação prévia detalhada sobre a
solução de problemas não-diretamente ligados com a engenharia (por exemplo o
desmatamento) já resultou em grandes perdas econômicas para a região e em
problemas adicionais para os reservatórios. No futuro, esta falta pode provocar
outros problemas ecológicos e socioeconômicos, cujas soluções serão custosas,
demoradas e politicamente difíceis. O enorme potencial hidrelétrico da bacia
amazônica e o entusiasmo justificado sobre a impressionante capacidade tecnológica
nacional não deveriam resultar numa aceitação total e indiscriminada de todos
os conceitos tecnocráticos e na construção precipitada de qualquer reservatório
tecnicamente viável. Em muitos casos, os custos ecológicos e, a longo prazo,
também os custos econômicos não são adequadamente correlacionados com os
benefícios.
USINA DE BELO MONTE E A QUESTÃO AMBIENTAL
O Xingu é um rio interior amazônico, que nasce
a oeste da Serra do Roncador e ao norte da Serra Azul, no leste
do Mato Grosso. Corre na direção sul-norte, paralelo
aos rios Tapajós e Tocantins, e após percorrer pouco
mais de 2 mil quilômetros, desagua ao sul da Ilha de Gurupá
(PA), na margem direita do Amazonas, do qual é um dos maiores
afluentes.
Cachoeiras da Volta Grande do Rio Xingu |
Segundo os estudos elaborados pela Eletronorte entre 1975 e
1980, a Bacia Hidrográfica do Xingu, que se estende por 450
mil km2, tem um potencial hidrelétrico de 22 mil megawatts,
um dos maiores do país. A Volta Grande do Xingu, uma queda
de 96 metros onde o rio quadruplica de largura e forma diversas cachoeiras
e ilhas, concentra boa parte do potencial hidrelétrico do rio
sendo por isso o local escolhido para a construção da
Usina Hidrelétrica de Belo Monte.
“A Volta Grande do Xingu, local que é chamado de 'fall line'
(linha de queda) sul-amazônica, nada mais é do que
o ponto de encontro de um relevo cristalino, portanto, duro, com
outro sedimentar, menos duro. Conforme a erosão do rio, o
ponto mais rígido fica e o sedimentar cede. No passado, quando
as cidades foram formadas, os viajantes, os jesuítas, vinham
de barco e paravam nos pontos de cachoeira porque o barco não
conseguia passar. Assim nasceram cidades como Tucuruí
e Altamira.
De acordo com artigo dos antropólogos Eduardo Viveiros de Castro
e Lúcia de Andrade, as perigosas cachoeiras do Xingu foram
o grande obstáculo para a invasão européia
na região, com a concentração de missões
e vilas até o século XX no Baixo Xingu.
Indígenas e Terras Indígenas na Bacia do Xingu
- 28 etnias
- 29 TIs(12 em Mato Grosso e 16 no Pará)
- 19 800 000 ha de extensão das TIs
- Cerca de 20 mil índios
Terras indígenas e população diretamente afetadas
- Duas TIs diretamente afetadas pela diminuição da vazão do rio: Paquiçamba e Arara da Volta Grande
- Área Indígena Juruna do km 17 da PA-415 será afetada pelo aumento do tráfego na estrada
- População total das três áreas = 226 pessoas
(Fonte: Rima/Eletrobrás)
Terras indígenas e população indiretamente afetadas
- TI Trincheira do Bacajá - 673 pessoas
- TI Koatinemo - 144 pessoas
- Arara - 236 pessoas
- Kararaô - 39 pessoas
- Cachoeira Seca - 81 pessoas
- Araweté - 398 pessoas
- Apyterewa - 411 pessoas
Total = 1982 pessoas
(Fonte: Rima/Eletrobrás)
População total direta e indiretamente afetada
- 317.472 habitantes dos municípios de Altamira, Senador José Porfírio, Porto de Moz,
Anapu, Vitória do Xigu, Medicilância, Gurupá, Brasil Novo, Placas, Uruará e Pacajá
- 350 famílias de ribeirinhos que vivem nas Resex do Rio Iriri, Riozinnho do Anfrísio,
Verde para Sempre e Médio Xingu
- 21 comunidades quilombolas
(Fonte: Rima/Eletrobrás)
Taxa de desmatamento nos municípios direta e indiretamente afetados (2008)
Extensão (km2) | Desmatamento (km2) | percentual (%) | |
Vitória do Xingu | - 2 969 | 1 728 | 58,22 |
Altamira | - 159 701 | 6 113,8 | 3,33 |
Sen.José Porfírio | - 14 388 | 631,5 | 3,87 |
Anapu | - 11 909 | 1 891,1 | 15,88 |
Brasil Novo | - 6 370 | 2 411,5 | 37,86 |
Gurupá | - 8 550 | 89,3 | 1,04 |
Medicilândia | - 8 271 | 1 798,6 | 21,75 |
Pacajá | - 11 852 | 4 565,2 | 38,52 |
Placas | - 7 174 | 1 597,6 | 22,27 |
Porto de Moz | - 17 429 | 773,1 | 4,44 |
Uruará | - 10 704 | 2 788,1 | 25,83 |
(Fonte: Inpe/Prodes)
Atividades econômicas e atores locais
Altamira, Anapu, Brasil Novo, Gurupá, Medicilândia,
Pacajá, Placas, Porto de Moz, Senador José Porfírio,
Uruará e Vitória do Xingu foram os municípios
definidos pela Eletronorte como a área de abrangência
de Belo Monte, locais que contam com Floresta de Terra Firme e Floresta
de Várzea. Mais de 300 mil pessoas vivem na região,
que tem como elemento integrador a Transamazônica e o Xingu
em sua parte navegável e Altamira como maior centro urbano
local, com mais de 70 mil habitantes.
“As cidades da 'fall line' estão interligadas pela
Transamazônica, que fez parte de um programa geopolítico,
que envolvia, entre outros, a construção de diversas
hidrelétricas na Amazônia para a expansão de
projetos de mineração e industrialização
do país e a colonização da região",
diz Costa. Porém, em função de um período
de incerteza econômica e instabilidade da moeda estrangeira,
Tucuruí só foi construída a duras penas. Os
projetos de colonização do governo foram conduzidos
pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
(Incra) a partir da década de 70 e contaram, principalmente,
com migrantes do Nordeste e do Sul do país, que se estabeleceram
em pequenas e médias propriedades.
Segundo Sônia Magalhães, pesquisadora do Departamento
de Ciências Humanas do Museu Goeldi (PA), existem dois tipos
de povoamento na área de influência de Belo Monte:
o mais antigo, representado por populações ribeirinhas
típicas da Amazônia, de origem indígena ou não,
com uma menor relação com o mercado; e o mais recente,
que se inicia com a colonização do Estado, notadamente
pessoas da Bahia e da Região Sul, pequenos e médios
agropecuaristas. “O campesinato mais consolidado, hoje formado por
pequenos e médios agricultores, vem obtendo conquistas importantes
relacionadas a políticas de crédito e ações
de infra-estrutura.” Uma das principais organizações
locais de trabalhadores rurais, a Federação dos Trabalhadores
na Agricultura (Fetagri) do Pará - filiada à Confederação
Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) - obteve há
pouco tempo, por exemplo, a abertura de uma linha de crédito
específica para a agricultura familiar, com recursos do Fundo
Constitucional do Norte. Segundo dirigentes da Fetagri, esta linha
de crédito possibilitou a permanência de mais de 700
famílias na região.
“Cacau, café, maracujá, pimenta, castanha,
arroz e feijão estão entre os principais produtos
agrícolas locais. Existem também algumas fazendas
de gado e, por outro lado, diversas populações ribeirinhas
e comunidades indígenas que se sustentam, basicamente, da
pesca”, afirma Reinaldo Correa Costa.
Juruna,
Assurini do Xingu, Araweté, Parakanã, Kararaô,
Xikrin do Bacajá, Arara, Xipaia e Kuruaia são os
povos indígenas que habitam a área de influêrncia direta e
indireta de Belo Monte, conforme apontado acima, e que somam mais de 2
200 habitantes. A Coordenação
das Organizações Indígenas da Amazônia
Brasileira (Coiab) acrescenta a esta lista vários povos
Kaiapó
e cerca de 1.130 índios que habitam a zona urbana de
Altamira
(clique no mapa ao lado).
Além da agropecuária e da pesca, a extração
de madeira também é uma fonte de renda local, complementa
Maria do Socorro Simões, coordenadora do projeto Imaginário
nas Formas Narrativas Orais Populares da Amazônia (IFNOIP),
da Universidade Federal do Pará (UFPA).
A extração predatória de madeira ocorre
principalmente nos municípios de Altamira, Senador José
Porfírio, Brasil Novo, Uruará e Senador José
Porfírio. De acordo com o diagnóstico do Instituto
do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) sobre a atuação
do setor madeireiro no Estado entre 1998 e 2001 divulgado no início
de outubro, o Pará responde pela produção de
65% da madeira em tora do Brasil. O engenheiro florestal Adalberto
Veríssimo, um dos responsáveis pelo estudo, explica
que a atividade madeireira atualmente não é significativa
na área de influência de Belo Monte. Apesar disso,
o diagnóstico aponta que está havendo uma migração
de madeireiras para o Oeste do Estado e, em menor proporção,
para pólos madeireiros de Altamira e Uruará.
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