FONTES DE ENERGIA NO BRASIL (Prof Gesiel Oliveira)

A lenha, utilizada
principalmente no preparo de alimentos, era a principal fonte de energia no
Brasil agrário do começo do século XX. No início da década de 1920, o
industrialismo incipiente associou-se ao crescimento do consumo de carvão
mineral. Após a Segunda Guerra Mundial, a rápida expansão industrial e a adoção
de um modelo rodoviário de transportes inauguraram o reinado do petróleo e da
hidreletricidade.
Nas últimas décadas, o
consumo de petróleo conheceu um declínio relativo, principalmente em razão
dos "choques" causados pela violenta ascensão do preço internacional
do óleo em 1973 e 1979. Um programa nacional de substituição da gasolina pelo
álcool (Proálcool) e o incentivo à utilização da eletricidade para certos
setores industriais, tradicionalmente movidos a óleo diesel, fizeram parte do
esforço governamental para diminuir o peso das importações do petróleo na
balança comercial brasileira. Além disso, o Brasil buscou diminuir o peso do
petróleo nas importações com o aumento da extração do petróleo nacional,
principalmente a partir do segundo "choque".
A expansão da hidroeletricidade
é fator de destaque: respondendo por pouco mais que 20% do consumo energético
total em 1975, a
hidroeletricidade saltou para cerca de 40% em 2000. Considerado estratégico
para o desenvolvimento nacional, o setor elétrico foi fartamente financiado
pelo Tesouro Nacional e por empréstimos externos, principalmente durante a
década de 1970. Esses recursos foram utilizados pela Eletrobras e suas
subsidiárias — Eletronorte, Eletrosul, Furnas e Chesf— na construção de
centrais hidrelétricas de grande porte. Porém, a crise econômica que marcou a
década de 1980 provocou redução drástica dos investimentos do setor.
Na década de 1990, as
importantes empresas do setor energético foram incluídas no Programa Nacional
de Privatização, e muitas delas foram vendidas. Entretanto, o volume de
investimentos realizados no setor continuou sendo insuficiente para atender à
demanda. O resultado foi uma crise energética de grandes proporções, que
começou no final dos anos 1990 e atingiu todo o país no ano de 2001, acentuada
por uma forte estiagem que diminuiu sensivelmente a capacidade de produção de
energia de origem hídrica. Em meio à crise, o governo impôs um sistema de cotas
de consumo a todos os setores, principalmente o industrial e o residencial.
Atualmente, 20% da geração e
80% da distribuição de energia elétrica já foram privatizados, mas o setor
continua instável e os consumidores convivem com tarifas cada vez mais
elevadas. As metas governamentais para a ampliação da capacidade instalada no
país, que dependem de grandes investimentos privados para a construção de
usinas termelétricas movidas pelo gás natural importado da Bolívia, não estão
sendo cumpridas. Nesse contexto, a discussão sobre a questão energética, tanto
no que diz respeito a novas alternativas de geração quanto aos programas de
conservação e eficiência, é cada dia mais urgente.
HIDRELETRICIDADE
O alto potencial hidrelétrico
brasileiro é determinado pela conjunção de dois fatores: o volume de águas
fluviais e o relevo. As elevadas médias pluviométricas — decorrentes do
predomínio de climas equatoriais e tropicais no território — e a disposição
dos divisores de águas que delimitam as principais bacias hidrográficas
brasileiras têm como resultado a
existência de muitos rios caudalosos e planálticos no país.
Nas bacias do Amazonas, Tocantins e Paraná encontra-se a maior parte do
potencial hidrelétrico nacional (tabela 1).
Distribuição geográfica do
potencial instalado
A concentração espacial da indústria no Brasil reflete-se
na concentração espacial da demanda energética. A Região Sudeste, pólo
industrial do país, é responsável por mais de 50% do consumo total da
eletricidade. As regiões Sul e Nordeste ocupam, respectivamente, o segundo e
terceiro lugares.
A Bacia do Paraná é a
principal fornecedora de hidreletricidade para as regiões Sudeste e Sul. Nela
estão instalados cerca de 70% do potencial gerador nacional. O Sudeste
conta ainda com a hidrelétrica de Três Marias, na Bacia do São Francisco (que
abastece o complexo siderúrgico do Vale do Aço mineiro) e com as usinas de
Salto Grande e Mascarenhas, no Rio Doce, que geram energia para os mercados
fluminenses.
Em meados da década de 1970,
abriu-se mais uma onda de investimentos no setor elétrico, desta vez destinados
à construção de hidrelétricas de grande porte em regiões distantes dos
mercados urbano-industriais. Em 1975, foi assinado um tratado associando o
Brasil ao Paraguai na construção de Itaipu, uma das maiores usinas hidrelétricas
do mundo. Itaipu está localizada no Rio Paraná, a catorze quilômetros da foz
do Rio Iguaçu.
As Sete Quedas do Rio Paraná
ficaram submersas em um enorme lago, que serve de reservatório à usina. A
potência ultrapassa os 12.000 MW, cerca de 25% de todo o potencial hidrelétrico
instalado no país. Ela opera com elevados custos de transmissão de energia:
dista 650
quilômetros de Curitiba e aproximadamente mil
quilômetros de São Paulo.
Na Região Nordeste, a
construção de usinas hidrelétricas na Bacia do São Francisco integrou o plano
de desenvolvimento regional implantado pelo governo federal na década de 1960.
Assim nasceram as usinas do sistema Centrais Hidrelétricas do São Francisco
(Chesf), completado nas décadas de 1980 e 1990 pelas usinas de Itaparica e
Xingo. Além delas, destaca-se, no Nordeste, a usina de Boa Esperança (Castelo
Branco), no Rio Parnaíba, entre o Piauí e o Maranhão. A Bacia Amazônica e a
Bacia do Tocantins, juntas, abrigam mais do que o dobro de toda a capacidade
instalada no país. Essa estimativa carrega um enorme grau de imprecisão. E não
é para menos: a riqueza da hidrografia amazônica exigiria um grande esforço
técnico e muito tempo de estudos para ser precisamente medida.
Na metade da década de 1970, a política de expansão
da capacidade energética do país com a construção de hidrelétricas gigantes
descobriu a Região Norte. Nos anos 1970, previa-se a utilização dos rios da
região para resolver os futuros problemas energéticos do Brasil e, ainda,
transformar a Amazônia em um grande pólo metalúrgico.
A usina de Tucuruí, que
entrou em operação em 1984, é uma das materializações desse projeto. Tucuruí
está localizada no Rio Tocantins, trezentos quilômetros ao sul de Belém.
A capacidade geradora é a
segunda maior do Brasil. Seu reservatório inundou 2.400 km de florestas que
não foram desmaiadas previamente.
A energia gerada em Tucuruí
alimenta os grandes projetos minerais da Amazônia oriental. É da grande usina
que vem a eletricidade para a produção de minério de ferro de Carajás e de
alumínio do sistema Albras—Alunorte. Além disso, a utilização intensiva do
potencial hidrelétrico da Amazônia acarretaria pesados custos de transmissão
em razão da distância dos principais centros consumidores.
A hidrelétrica de Balbina, no
Rio Uatumã, é outro grande empreendimento da Eletronorte. Grande no preço e na
devastação, mas pequeno na produção de energia. Situada a duzentos quilômetros
de Manaus, a usina foi projetada para suprir a demanda energética da capital
amazonense. Entretanto, sua capacidade geradora já se tornou insuficiente
diante do crescimento populacional e industrial da cidade.
O reservatório da usina
inundou 2.430 km2, pouco menos que Tucuruí, para uma capacidade
instalada de apenas 250 MW. Isso significa que, para cada MW produzido,
Balbina submergiu 31 vezes mais florestas do que Tucuruí.
A viabilidade de novas usinas
hidrelétricas na Bacia Amazônica como alternativa para o suprimento da futura
demanda energética do país continua mobilizando calorosas discussões entre os
especialistas. O enorme impacto ambiental derivado da inundação de grandes
áreas florestadas e a necessidade de remoção de grupos indígenas
OS PROJETOS TERMELÉTRICOS
O Brasil importa a maior
parte do carvão mineral que consome. A produção da Região Sul, onde se
concentram as principais reservas carboníferas do país, é insuficiente para
atender à demanda nacional.
O carvão existente em Santa Catarina
(carvão metalúrgico) é o único aproveitável como matéria-prima nas indústrias
siderúrgicas. O Rio Grande do Sul detém as maiores reservas de carvão-vapor,
utilizado no aquecimento das caldeiras de alguns setores industriais e na
produção de energia termelétrica,
Na Região Norte, apesar do
imenso potencial hidrelétrico da Bacia Amazônica, a fonte térmica responde
por cerca de 12% do total da eletricidade gerada. Nesse caso, a maioria das
usinas termelétricas são de pequeno porte e utilizam óleo diesel como combustível.
O exemplo de Manaus é significativo: mesmo após a inauguração da usina de
Balbina, a capital amazonense continuou precisando do petróleo para atender
parte de suas necessidades energéticas.
Desde a década de 1990, a expansão do setor
termelétrico do Brasil está sendo realizada com base no gás natural, menos
poluente que o carvão ou o petróleo. A crise da geração de energia hidrelétrica
de 1999 a
2000, causada pela estiagem, mais a descoberta de vastas reservas de gás
natural na Bolívia podem ter aberto um novo caminho para a produção de
eletricidade no Brasil.
A construção do gasoduto
Brasil-Bolívia proporcionou condições para investimentos em usinas
termelétricas movidas a gás. Essas usinas são ecologicamente mais limpas que
as alimentadas com carvão ou petróleo e têm baixo custo de instalação se
comparadas às hidrelétricas, O novo gasoduto percorre Mato Grosso do Sul e São
Paulo, para depois se interligar à rede de gasodutos da Região Sul.
Além das importações de gás da Bolívia, o Brasil pode contar com
reservas descobertas na plataforma continental (nas bacias de Campos e de
Santos) e no Amazonas. Assim, a tendência é de crescimento da participação do
gás natural e da geração termelétrica na produção brasileira de eletricidade.
O programa nuclear
A história das usinas
termonucleares no Brasil começou em 1969, quando o governo comprou da empresa
norte-americana Westinghouse a usina de Angra I, com capacidade de 600 MW,
alimentada por , urânio enriquecido. Como o acordo de venda não previa a
transferência da tecnologia de enriquecimento do urânio, o Brasil precisava
importar dos países desenvolvidos o urânio a ser consumido na usina.
Em 1975, o general Ernesto
Geisel assinou um acordo com a Alemanha para a construção de reatores
nucleares. O custo dos oito primeiros reatores atingiria trinta bilhões de
dólares, cerca de duas vezes o preço de Itaipu, cuja capacidade ultrapassa os
12.000 MW. Esse amplo acordo de "cooperação" previa a transferência
paulatina da tecnologia de enriquecimento do urânio.
O acordo nuclear
Brasil-Alemanha jamais chegaria a ser completado. Dos oito reatores previstos,
somente Angra II está em funcionamento.
Além da energia, as usinas
geram também uma imensa quantidade de resíduos radiativos. Esse é um dos
principais alvos da crítica dos ambientalistas
com relação às usinas
nucleares brasileiras: ainda não se resolveu o que fazer com o material
radiativo, estocado em depósitos "provisórios".
PETRÓLEO
O petróleo passou a ser
encarado como fator estratégico durante o Estado Novo (1937-1945). O
nacionalismo de Getúlio Vargas foi o responsável pela criação do Conselho
Nacional do Petróleo (CNP), em 1938. Mais tarde, no pós-guerra, também seria
Vargas (amparado por um vasto movimento de opinião pública) o criador da
Petrobras, empresa estatal monopolista, em 1953.
Contudo, até o início de 1970, os maiores investimentos da Petrobras
concentravam-se em seu parque de refino. As reservas do Recôncavo Baiano e da
bacia sedimentar do Nordeste já eram conhecidas e exploradas, mas o preço do
petróleo no mercado internacional era baixo demais para justificar grandes
investimentos em pesquisa e prospecção do óleo no Brasil. O refino do petróleo,
realizado predominante-mente pela estatal, concentra-se nas proximidades dos
mercados consumidores. Essa é uma regra mundial, pois o transporte do óleo
bruto, por meio de embarcações ou oleodutos, é mais barato que o transporte dos
produtos refinados. Por isso, a maior parte das refinarias da Petrobras
localiza-se no Sudeste. Os "choques" de preços do petróleo, promovidos
pela Opep em 1973 e 1979, mudaram essa história. No início da década de 1980,
o petróleo despontava como o grande vilão da balança comercial brasileira,
impondo uma pesada conta de importações numa conjuntura marcada pela chamada
"crise da dívida externa".
Nessa época, a
auto-suficiência com relação ao combustível transformou-se em prioridade
nacional. Mais uma vez, o petróleo aparecia como fator estratégico do
desenvolvimento, o que justificava pesados investimentos produtivos da
Petrobras.
A ampliação da pesquisa e
prospecção de petróleo demandou um grande esforço tecnológico por parte da
Petrobras. O resultado desse esforço foi a descoberta de promissoras bacias
petrolíferas na plataforma continental, em especial na Bacia de Campos, no Rio
de Janeiro.
A extração de petróleo no
subsolo dos oceanos é uma atividade cara e exposta a muitos riscos. Mesmo
assim, atualmente mais de 70% do petróleo extraído no Brasil provêm da
plataforma continental.
O grande destaque é o Estado
do Rio de Janeiro, onde se localizam as plataformas da Bacia de Campos.
Mais tarde, registrou-se uma
tendência de declínio do consumo do petróleo nacional, em parte pela acentuada
diminuição nos preços e crise financeira da Petrobras.
Todavia, desde a segunda
metade da década de 1990, a
produção nacional de petróleo passou a crescer de forma acelerada com a entrada
em operação de novos depósitos em águas profundas da Bacia de Campos. Em 2002, a produção nacional
atingiu 85% do consumo interno, aproximando-se da meta de auto-suficiência*
O Programa Nacional do Álcool
O Programa Nacional do Álcool
(Proálcool), lançado em 1975, no contexto do primeiro "choque" do
petróleo, deveria contribuir para aliviar a conta de importações do país e
reduzir a dependência em relação ao petróleo. O programa tinha como meta a
substituição paulatina da gasolina pelo álcool nos carros de passeio.
Para incentivar o aumento da
produção de álcool de cana-de-açúcar, o Proálcool previa a concessão de uma
série de benefícios financeiros aos plantadores de cana e aos proprietários de
usinas, principalmente os da Região Sudeste. Ao mesmo tempo, as indústrias
automobilísticas foram incentivadas a passar a produzir carros movidos a álcool
e, aos usuários desses automóveis, foram concedidos benefícios fiscais.
O auge do Proálcool ocorreu
em 1986, quando o consumo de álcool combustível ultrapassou o de gasolina
automotiva. Entretanto, a redução dos preços internacionais do petróleo colocou
limites para a substituição da gasolina, acabando por arrastar o próprio
Proálcool para uma crise. A Guerra do Golfo, em 1991, e a subseqüente diminuição
da influência da Opep reacenderam o debate em torno do futuro do combustível
automobilístico no Brasil.
Muitos analistas, favoráveis
ao Proálcool, usam como argumentos a instabilidade dos preços do petróleo no
mercado mundial e a probabilidade de ocorrência de novos "choques" no
futuro próximo. Dessa forma, defendem a conveniência da manutenção dos
subsídios ao Proálcool. Os ambientalistas concordam, pois os carros movidos a
álcool são menos poluentes, contribuindo para tornar mais respirável o ar das
grandes cidades brasileiras.
Os críticos do Proálcool tendem a insistir no elevado custo econômico
dos subsídios, defendendo
uma atitude liberal em
relação à questão energética, que deveria ser regulada pelas leis de mercado.
Alguns deles também enxergam no programa uma influência negativa para o setor
agrícola, já que a
lucratividade artificial do
cultivo de cana-de-açúcar para as usinas alcooleiras estaria desviando terras
aptas para a produção de alimentos e matérias-primas industriais.
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