Cedo acordo ao som ininterrupto do bipe. Quero ficar um pouco mais, mas a dura realidade não me permite. Ainda é noite, mas meu dia já começou. Tomo banho às pressas, e ainda me enxugando, aos tropeços escolho minhas poucas e surradas roupas. Tenho minimizado no meu peito a esperança de que isso vai melhorar, algum dia, que isso vai passar. Corro para a parada, e lá encontro as mesmas pessoas, no mesmo horário, no mesmo ritmo frenético, e com meu sorriso formal e frio, nem mesmo preciso dizer bom dia naquele silêncio coletivo de vidas acinzentadas. Vivo num mundo onde sou invisível. Onde mecanicamente sigo no embalo do tempo, pressa e metas. Faço sempre as mesmas coisas. Os dias se passam sem mesmo que eu perceba o meu primeiro cabelo branco e as rugas que mudam dia após dia a minha expressão facial. Eu lembro que um dia eu fui mais alegre, mais disposto e mais sonhador. O fim de mais um cansativo e exaustivo dia chega. E no retorno dentro do coletivo ouço comentários sobre coisas que não vi, quero respostas a respeito de perguntas que nem sei de onde surgiram. Lembro das promessas que não cumpri e do meus planos que aos poucos foram se esvaindo até virarem apenas uma lembrança. Meu celular, quando tenho créditos, é o meu amigo sempre presente. Ele me abre um mundo fantasioso onde posto coisas que não sou, que não vivo e não tenho. Mas ele ainda é o meu último refúgio de uma vida enfadonha e sem sentido. Quando chego em casa não sei o que dói mais, se a minha cabeça, minha coluna ou minha consciência, presa à uma rotina que mesmo que eu deseje, nada muda. Entra dia, sai noite e vou me acomodando. São correntes invisíveis que me entorpecem e me aprisionam como um escravo livre. Eu sempre quis voar alto, mas me sinto como águia vivendo no galinheiro. Eu sempre sonhei com algo diferente disso, mas algo me amarra. O que fazer? Como fazer? Enquanto penso nisso, ajo, digo, repito a rotina. Enquanto sonho com o meu mundo ideal, sigo no meu mundo real. Lembro-me das palavras da minha mãe: “Tudo tem o seu tempo, tudo tem a sua vez”, mas tenho a impressão que a minha nunca chega. Eu sei que não é só o tempo que vai mudar a rota da minha vida. Não avanço porque vivo esperando o futuro pra ser feliz, sem mudar a rota do meu presente, ancorado em medos, frustrações e amarguras do meu passado. Às vezes tenho a impressão de que estou a dar socos no ar, e me pego novamente sonhando, e aí estaciono. Vejo pessoas alcançando seus objetivos, e me limito a ficar falando mal, ao invés de tomá-las como inspiração. Não sou o anjo que alguns pensam, nem sou tão ruim como meus inimigos querem. Sou apenas um ser humano cheio de falhas, sonhos, altos e baixos. Eu quero um dia soltar as âncoras do meu navio e rumar na direção do meu mar de desafios. Quero navegar rumo a novos portos, conhecer novos horizontes. E tenho de confessar que estou parado na tempestade, sem sinal de calmaria. Estou na parte de baixo nas voltas da roda gigante dessa vida. Não sei se essa roda gigante enguiçou. Mas enquanto ela não voltar a funcionar, vou ficando com esse angustiante e ininterrupto bipe, com meus olhos vermelhos, meus bolsos empoeirados e minha enferrujada esperança, porque isso sempre me foi bem mais cômodo.
44 anos do Naufrágio do Novo Amapá, o maior naufrágio da história do Brasil. Todo mundo já ouviu falar sobre a história do Naufrágio do Barco Novo Amapá, mas quase ninguém conhece as histórias que naufragaram junto com ele. Hoje quero compartilhar com vocês um pouco sobre uma destas tantas. A história de amor que aquele naufrágio levou junto. A história do casal Odivaldo Ferreira de Souza (mais conhecido como Tio Filho) e Célia Lúcia O. Monteiro, uma maranhense que a época residia em Beiradão, atual Vitória do Jari. Filho e sua esposa Célia Ele trabalhava na empresa Jari Celulose, sexto filho de uma família de 9 irmãos, filhos da Dona Maria Lindalva Ferreira de Souza (hoje com 90 anos) e Seu Paulo Coutinho de Souza (87) que até hoje moram na Av Marcílio Dias no bairro do Laguinho. Eu tinha apenas 3 anos de idade a época do fato, e ainda tenho uma foto ao lado deste meu tio tão querido por todos . O Barco Novo Amapá partiu às 14h do dia 06/01/1981 rumo ao Vale do Jari. A trag...
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